Empresas adiam investimentos no exterior e repatriam recursos
22/04/09
A crise econômica mundial pegou a Marcopolo em franco processo de expansão internacional. Uma das grandes multinacionais brasileiras, a Marcopolo inaugurou em fevereiro sua segunda fábrica na Índia, um investimento de US$ 60 milhões, e se prepara para inaugurar outra planta no Egito, investimento de US$ 25 milhões em três anos.
“A crise chegou no momento em que alguns projetos já estavam decididos e tivemos de tocar adiante”, diz o presidente da Marcopolo, José Rubens de La Rosa. “Postergamos para o próximo ano cerca de 25% do investimento previsto para este ano e procuramos usar de forma mais intensiva os ativos já construídos.” O jeito encontrado pela empresa foi reduzir custos e o ritmo das obras. Assim como a Marcopolo, as multinacionais brasileiras estão reagindo à crise reduzindo ou adiando investimentos, mas sem se desfazer de ativos, como mostram os números referentes às contas externas do Banco Central.
Depois de bater recordes, o saldo dos investimentos brasileiros diretos no exterior no primeiro bimestre ficou negativo em US$ 682 milhões. No mesmo período do ano passado, os investimentos no exterior totalizaram US$ 2,35 bilhões. Mas, apesar do saldo negativo, as empresas não estão vendendo ativos, apenas trazendo de volta recursos que seriam usados para novos investimentos em outros países. Só no primeiro bimestre, as empresas trouxeram US$ 1,3 bilhão a título de amortização recebida – ante US$ 289 milhões no mesmo período do ano passado.
“As companhias estão acelerando o ritmo da amortização, uma vez que o estoque de capital no exterior não mudou tanto para justificar uma variação tão forte assim”, afirma Luís Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet). “Com a falta de crédito, as empresas que estão precisando de recursos estão enxugando o caixa de suas filiais no exterior.” Praticamente todas as multinacionais brasileiras estão reduzindo o ritmo da produção e demitindo lá fora.
A Vale demitiu 1,2 mil funcionários no exterior, dos quais 900 trabalhavam para a produtora de níquel Vale Inco em diversos países. Alguns altos-fornos da siderúrgica Gerdau nos Estados Unidos estão praticamente parados. O grupo demitiu 75% da força de trabalho na Gerdau Macsteel (300 funcionários) em janeiro e outros 180 funcionários na Gerdau Ameristeel no mês passado. O grupo Votorantim demitiu 500 na fábrica de cimentos Prairie, cuja sede fica em Chicago, nos Estados Unidos. A fábrica foi adquirida no início do ano passado, época em que o grupo, aproveitando-se do real forte, estava em ritmo frenético de aquisições no exterior.
Além da Prairie, o grupo adquiriu nos últimos dois anos a mineradora US Zinc (por US$ 295 milhões) e a siderúrgica argentina AcerBrag. Apesar do cenário complicado, a Votorantim não deixou de investir no exterior. No mês passado, a divisão de Metais do grupo captou US$ 300 milhões no exterior, recursos que serão destinados à expansão da produção de zinco na fábrica de Cajamarquilla, no Peru. SEM MERCADO “Quem se internacionalizou com investimentos dificilmente vai se desfazer de posições. Até porque não há muita alternativa, pois não tem mercado para comprar os ativos”, afirma o professor do centro de internacionalização da Fundação Dom Cabral, Álvaro Cyrino.
Resta às empresas, diz ele, “usar da criatividade empresarial e de gestão para contornar e enfrentar a tempestade da melhor forma possível.” O argumento da internacionalização sempre foi o da diluição dos riscos. Com essa crise, porém, quem tinha presença forte no exterior, sobretudo na Europa e nos EUA, é quem mais está sofrendo. “O que sempre se dizia é que o fato de você estar presente em diversos países ajuda a diluir os riscos, permitindo o melhor balanceamento dos problemas de cada país”, afirma La Rosa, da Marcopolo. “Mas, nesta crise, isso não é verdade.
A crise atacou todo mundo e, como o Brasil é um dos que está se saindo melhor, se estivéssemos apenas no Brasil sem dúvida estaríamos sofrendo menos agora. Mas nossa visão é de longo prazo. Se não tivesse se expandido fora do País, a Marcopolo seria metade do que é hoje.” A empresa, que faz 60 anos este ano, faturou R$ 2,4 bilhões no ano passado. Os ajustes na produção ao redor do mundo estão sendo pontuais, diz o presidente da Marcopolo. Dos oito países onde está presente com fábricas de ônibus (incluindo a do Egito, que será inaugurada no segundo semestre), o único em que a empresa fez cortes drásticos foi a Rússia, onde possui duas plantas.
Uma foi fechada e os 600 funcionários dispensados, enquanto a outra está parada, com 200 funcionários em licença. “Acreditamos muito na Rússia e não vamos sair de lá, mas a situação neste momento está bem complicada.” Apesar de ter reduzido sua produção no exterior por causa da crise das montadoras, a fabricante de autopeças Sabó também segue firme em sua estratégia de internacionalização. “Precisamos estar perto do centro de decisão das grandes montadoras, e esse centro de decisão não está no Brasil”, afirma Luis Gonzalo, diretor geral da Sabó para América do Sul. Ele não revela os números de demitidos, mas diz que o que houve foi uma “adequação à demanda.”
Agência Estado / Brasil Infomine