Retomada de preço e produção só deve ocorrer após junho
05/01/09
Vera Saavedra Durão, do Rio e São Paulo
02/01/2009
O ano de 2009 será desafiador para as empresas de mineração e siderurgia, fortemente atingidas pela virulência da crise dos mercados desde o segundo semestre de 2008, que congelou o crédito bancário e contaminou a economia real. O “tranco” foi tão violento que paralisou a demanda por minério de ferro, levando a Vale do Rio Doce, maior produtora do insumo, a cortar 10% na sua produção de 300 milhões de toneladas anuais, enquanto as usinas de aço apelaram para a mesma estratégia ao ver os preços dos seus produtos despencarem em média quase 50%. O volume de vendas está muito ruim em todo o mundo e a queda da produção de aço é significativa.Gustavo Lourenção / Valor
Silvio Tini, acionista da Buritirama e da Paranapanema: mercado de minério vai continuar volátil e pouco demandado.
No Brasil, dados do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), informam que o parque siderúrgico produziu em novembro 2,3 milhões de toneladas de aço bruto, volume que, anualizado, equivaleria a 27 milhões de toneladas ante uma capacidade instalada de 41 milhões de toneladas. O que mostra que no fim de 2008 o setor siderúrgico brasileiro estava operando com ociosidade de 30%, o maior índice desde o Plano Collor, em 1990, como destaca o especialista em commodities, Germano Mendes de Paula, economista e professor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia. O IBS previu em meados de dezembro produção de 34,2 milhões de toneladas no ano.
“Esta situação não deve perdurar”, avalia Mendes de Paula. Os mercados de minério e aço estão parados, mas em alguma hora vão voltar, senão quebra todo mundo, diz o economista, também consultor de empresas. “É uma estratégia de esperar para ver. O padrão atual tem a lógica de formação e queima de estoques. Mas, vamos ter um cenário melhor da siderurgia brasileira a partir de abril, quando devem fechar as negociações de preço do minério e a China vai dar o ritmo para a mineração. O primeiro trimestre do ano vai ser ainda um período ruim, mas no segundo trimestre será possível ter alguma clareza dos negócios no ano”, prevê. “O primeiro trimestre será um período de ressaca. O jogo só vai começar mesmo no segundo”, pressagia.
O controlador da mineração de manganês Buritirama, Sílvio Tini de Araújo, já vê um 2009 “muito pesado” para o setor de mineração. Ele adiantou ao Valor que vai reduzir pela metade a produção de manganês da mineradora já neste início de ano.
“Em 2008 vendemos 800 mil toneladas de manganês, matéria-prima para ferro-liga, indispensável na produção de aço. Este ano, estamos prevendo produzir metade disso – 400 mil toneladas”. O empresário, que também tem participação em outra empresa do setor, a Paranapanema, acredita que o mercado de minério vai continuar volátil e pouco demandado.
“Os importadores chineses, que comandam os preços das commodities estão aproveitando e brigando pelo preço. Eles estão especulando para baixo e para nos proteger vamos cortar a produção pela metade “. O preço da liga de manganês, segundo Tini, chegou a US$ 12 o dmtu (teor de manganês contido na tonelada de minério) e agora está em US$ 7. Em 2009, deverá, em sua opinião, se manter entre US$ 6 a US$ 7.
O empresário disse que o custo de produção do minério de manganês está muito alto e se não tiver consumo não adianta produzir. “O volume de consumo tem um piso, mas o mundo não vai deixar de consumir e construir”. Tini acredita que os indianos em breve serão uma alternativa de demanda de minério em relação aos chineses. “Eles estão buscando acelerar seu crescimento e este ano podem acessar o mercado de minério antes dos chineses, que só vão voltar a comprar minério no segundo semestre”.
Relatório do Credit Suisse sobre mineração e siderurgia prevê que os cortes de produção que atingiram mineradoras e siderúrgicas no quarto trimestre de 2008 se mantenham pelo menos até o primeiro semestre de 2009. Os analistas Roger Downey, Ivan Fadel e Leonardo Corrêa, prevêem que o volume de produção de minério de ferro da Vale caia 6% em 2009 ante o ano de 2008 fechando os 12 meses em 280 milhões de toneladas por causa dos cortes no primeiro semestre. O banco suíço espera que a Vale mantenha o corte de 30 milhões de toneladas anualizadas (anunciado para o último trimestre de 2008) no primeiro trimestre e, no segundo, corte 20 milhões de toneladas anualizadas. A expectativa dos analistas do CS é de recuperação da produção de minério no segundo semestre atingindo um nível de produção anualizado de 330 milhões de toneladas.
Mendes de Paula acha que o setor siderúrgico nacional, como já ocorreu em 2008, vai ter uma produção menor porque vai vender mais para o mercado doméstico, já que a economia externa está mais fria. “Vamos saber como vão funcionar as medidas do governo de isenção do IPI para a cadeia automotiva e isenção de impostos para a construção civil, que poderão garantir mercado para a indústria do aço. O governo vai apostar todas as fichas na construção civil”, avalia. O Estado, segundo ele, tende a adotar medidas para apoiar essas empresas nesta situação desfavorável de crise e o protecionismo pode voltar como estratégia de defesa, como está acontecendo na Rússia, lembra o consultor de empresas.
As empresas do setor de mineração e siderurgia já começam a demitir. O fato preocupa o governo, pois afeta o consumo doméstico. “As empresas têm que vender, senão começam a engavetar projetos que não saíram do papel. Os que estão em curso continuam em ritmo mais lento, mas o investimento novo terá que esperar”, diz Mendes de Paula. A seu ver, o impacto foi forte demais e este processo de recuperação dos mercados vai levar a uma seleção natural das empresas que foram apanhadas no contrapé da reversão de expectativas. Muitas empresas podem quebrar neste processo de reestruturação, alerta.
O mercado, volátil como está, dificulta até um processo de consolidação mais forte no setor siderúrgico e novas aquisições na mineração, como afirma Ronaldo Valiño, especialista em fusão e aquisição nos setores de minério e aço da PricewarerhouseCoopers.
Ele acha que o setor siderúrgico deve passar por uma avaliação um pouco mais profunda . As usinas de aço devem adiar seus investimentos de verticalização, depois de terem comprados muitas minas em 2008, pois o preço do minério vai ficar barato e a estratégia vai ser de gastar pouco e manter o caixa. Em 2009, conforme projeta, tanto na mineração, quando na siderurgia, devem acontecer aquisições pontuais e pequenas. As grandes aquisições estão fora deste cenário, pois nenhum banco vai financiá-las. Para Valiño, 2009 será um ano muito complicado para mineradoras e siderúrgicas num ambiente hostil de redução de demanda e estoques elevados. E não crê que haja recuperação destes mercados este ano. Mas, no médio prazo vai voltar a demanda por matéria-prima. “A partir de 2010 a tendência é de recuperar. Todas as mineradoras e siderúrgicas anunciaram redução de produção e adiaram projetos. A oferta vai encurtar. Em algum momento, esta curva vai virar”, prevê.
Valor Econômico