Recuo da China terá pouco impacto
26/06/12
As relações comerciais entre o Brasil e a China não devem sofrer alterações em 2012, apesar do recuo previsto na economia do gigante asiático. “O Brasil pode ficar tranquilo quanto aos produtos que exporta. A China vai crescer e vai continuar consumindo”, afirma Charles Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCIBC). Nos últimos tempos, a economia chinesa tem se destacado com médias de crescimento anual na faixa de 10%. Fechou 2011 com taxa de 9,2% e para este ano as autoridades locais admitiram um recuo para 8,5%, fato que gerou preocupação em todo o planeta. No caso do Brasil, isso afeta em especial o setor de mineração, uma vez que a China é o principal comprador do minério de ferro nacional.
Em 2011, as transações comerciais entre os dois países foram da ordem de US$ 77 bilhões, com superávit favorável de US$ 11,5 bilhões, sendo que o envio de minério de ferro respondeu por cerca de 45,5% das vendas. “A previsão é que em 2012 as transações fiquem em torno de US$ 100 bilhões e com superávit ainda mais favorável ao Brasil”, diz Tang.
Mesmo em um ambiente de leve retração, os números impressionam. A Associação do Ferro e Aço da China (Cisa, na sigla em inglês) divulgou informe no qual prevê desaceleração da produção local de aço, que este ano deve ser de 680 milhões a 700 milhões de toneladas. Em 2011 foram 683 milhões de toneladas (a capacidade instalada do parque industrial brasileiro é de 47,8 milhões de toneladas). “Foi um crescimento estupendo na instalação de novas siderúrgicas desde a década de 80, de 30 milhões de toneladas anuais”, afirma Amilcar Teixeira, sócio da consultoria Metal Data.
Hoje, são centenas de usinas em operação, o que levou a China a se tornar responsável por 46% da produção mundial de aço. Grande parte vai para o setor de infraestrutura e construção civil e, de alguns anos para cá, também para a indústria de bens de consumo duráveis, como automóveis, eletroeletrônicos e máquinas, itens voltados para o mercado externo, inclusive o Brasil. Foi nesse clima de festa que empresas brasileiras como a Vale bateram recordes de exportação de minério de ferro, principal matéria-prima do produto.
Mas, nos últimos dois anos, a economia europeia começou a patinar e a China se viu obrigada a fazer uma mudança de rumo. “A China não colocou o pé no freio, o país simplesmente não podia interromper bruscamente o processo de crescimento. O que houve foi uma reestruturação por meio da transferência da demanda das exportações para o mercado interno, aumentando os investimentos em infraestrutura”, afirma o economista Rubens Sawaya, coordenador do curso de economia da PUC-SP. Na visão do economista, não há o menor risco de uma recessão ou de uma espiral inflacionária na China. “É um país com 1,5 bilhão de pessoas e com enorme espaço para gerar renda e consumo. Além do que, não se trata de uma economia de mercado. As autoridades são centralizadoras e há forte controle na atividade das companhias estrangeiras lá instaladas. O país vai continuar com taxas de crescimento acima de 8%”, acredita Sawaya.
Para o pesquisador Norman Gall, presidente executivo do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, o problema maior da China está em um futuro não tão distante: a escassez de recursos naturais, que irá comprometer o crescimento do país. Gall passou recentemente seis semanas na China com o intuito de analisar os recursos hídricos do pais. Ficou impressionado com o que viu. “Vi obras espetaculares, mas também muita poluição e uma população que está envelhecendo rapidamente sem que haja serviços sociais ou hospitais públicos em volume suficiente”.
O pesquisador constatou que houve uma falta de atenção histórica com relação ao aspecto ambiental e uma prioridade no crescimento desenfreado da economia. De acordo com Gall, um terço das cidades chinesas está no ranking das que mais sofrem com a escassez de água, sendo que 16 cidades locais estão entre os 20 municípios mais poluídos no mundo.
No caso das siderúrgicas, a utilização de água é parte fundamental na produção e no esfriamento do aço. Estudos da indústria do aço nos Estados Unidos trabalham hoje com índices médios de 8,6 a 4,1 toneladas de água para produção de uma tonelada de aço. Siderúrgicas mais avançadas em questões ambientais podem otimizar a produção até abaixo de 3 toneladas. “Na China, o processo gera muito lixo e resulta em enorme poluição nos rios. Notei que o problema já preocupa as autoridades chinesas. Eles terão que ter muita criatividade para apresentar soluções em curto prazo”, diz Gall.
Valor Econômico