Projetos valorizam a estabilidade e olham para o longo prazo
08/12/08
O investimento direto estrangeiro (IDE) tem um ciclo diferente do capital de curto prazo. Em primeiro lugar, não busca retorno imediato. Trata-se de um processo longo que é feito por empresas e que leva tempo para ser concluído. A outra diferença é que o IDE olha a estabilidade do país e se as perspectivas de longo prazo são positivas. “Em tempos de crise, muito se fala sobre bolsa, dólar, juros, mas o que move a economia mesmo são os investimentos físicos, ou seja construções, máquinas e equipamentos, aquisições de empresas”, diz Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP e economista-chefe da Siemens.
Marisa Cauduro / Valor
Antonio Corrêa de Lacerda: “Falta ação comum entre governo e indústria”
Uma das características do IDE, diz ele, é direcionar o foco para áreas em que o país tem vantagens competitivas, recursos naturais e capacidade produtiva. É o caso no Brasil dos segmentos automobilístico, de mineração, siderurgia e papel e celulose. “Poderíamos aproveitar mais em áreas inovadoras, trazer investimento para setores onde o país tem debilidades e é deficitário na balança comercial como, por exemplo, bens de capital, semi-condutores e química fina”, observa. O economista é favorável a que o governo assuma uma política para incentivar investimentos nessas áreas. “Ainda dependemos da estratégia das empresas. Falta uma ação comum entre governo e indústria. Não falamos para os investidores o que queremos.”
O fluxo de investimento estrangeiro direto no Brasil começou a aumentar a partir de 1996, com as privatizações. Segundo dados do Banco Central o total de ingresso de IDE no país em 1994 era de US$ 2,6 bilhões. Nos anos seguintes houve um salto exponencial até alcançar o pico, em 2000, de US$ 32, 8 bilhões. A crise em 2001 reduziu o fluxo até atingir o menor nível em 2003 (US$ 10,1 bilhões). A partir desse ano, o IDE para o Brasil voltou a crescer e hoje está na casa dos US$ 36 bilhões.
Com a crise atual, esse volume deve refluir em razão da falta de liquidez das empresas que investem. Mas, ao contrário do capital especulativo que foge do país numa situação de crise, o IDE permanece. Essa é outra diferença importante. Em 2007, o total de IDE no mundo chegou a US$ 1,8 trilhão, tendo como origem 79 mil empresas transnacionais, cujo faturamento somado é de US$ 31 trilhões, de acordo com dados da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet).
“O IDE é a melhor fonte de investimento que pode existir”, afirma Júlio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI). “Se toda relação do país fosse na forma de IDE seria muito mais seguro, mas isso não é possível. O país sempre precisa de recursos de curto prazo e de empréstimos”, diz. Para ele, o Brasil é o emergente mais cobiçado. Se quiser manter essa posição, o país deve proteger a economia. “O Brasil está em desvantagem porque entrou tarde nesse processo. O país só transmitiu ao mundo que estava crescendo em 2007 e 2008. Poderia ser melhor se tivesse feito política de reduzir os juros. Outros países aproveitaram mais essa onda. Se a crise durar um ano e voltar o perfil de dinamismo anterior, o Brasil retoma rapidamente a capacidade de ser atraente.”
As economias emergentes aumentaram, a partir de 2000, a parcela de ingresso de IDE. Nos últimos 15 anos, diz Corrêa de Lacerda, o Brasil melhorou muito a sua atratividade e só perde para a China em recebimento de investimentos. Ele atribui esse fato a vários fatores: “O Brasil é uma das maiores economias do mundo; afastou o fantasma da inflação, é uma economia altamente industrializada e tem uma legislação favorável aos investimentos estrangeiros”.
No mundo, o fluxo de IDE é movido por fusões e aquisições. Em 2007 a proporção alcançou 89% do total de investimentos. O mesmo não ocorre em economias que se abriram mais recentemente, como é o caso do Brasil e da China. Em 2007, por exemplo, 70% dos investimentos feitos no Brasil foram para operações chamadas greenfield, ou seja, construção de novas plantas. A queda no volume de aquisições e fusões no mundo foi de 29% no primeiro semestre de 2008 comparado com o segundo semestre de 2007.
O número de fusões e aquisições no Brasil, segundo a KPMG, dobrou, de 2004 até 2007 – de 69 para 143, envolvendo aquisições de empresas brasileiras por companhias estrangeiras. Até outubro o total apurado é de 106 operações. Segundo Luís Motta, sócio de fusões e aquisições da KPMG, as transações entre empresas brasileiras aumentou de 108, em 2004, para 347 este ano. “As empresas nacionais estão sendo mais rápidas nas tomadas de decisão para aproveitar as oportunidades”, diz. Para Motta, os IPOS foram usados como uma alternativa de trazer investimento estrangeiro para o país. “Para alguns investidores é menos arriscado comprar a participação de uma empresa local do que se estabelecer criando uma empresa nova”, assinala. Julio Gomes de Almeida observa que o IDE traz tecnologia, experiência, produtos novos, melhora a qualidade e induz efeito demonstração para produtores locais. Outro benefício é o de cobrir o déficit de transações correntes, compensando o fluxo de saída de dólares. (E.P.A.)
Valor Econômico