Minoritário avalia contestar oferta da Mittal
26/10/06
Por Vera Saavedra Durão e Luciana Monteiro
;
A queda de 7,42% das ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Arcelor Brasil ontem refletiu a frustração do mercado com o preço oferecido pela Mittal Steeel, agora Arcelor Mittal, na proposta de oferta de aquisição de ações (OPA) aos minoritários da sua controlada brasileira. A desvalorização dos papéis, que fechou cotado a R$ 36,80, foi o maior entre as ações que compõem o Índice Bovespa.
;
Em comunicado divulgado ontem, a empresa informou a disposição de acatar decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e entrar com pedido de registro de oferta pública na autarquia. A multinacional, que detém 66% das ações da Arcelor Brasil, disse que os acionistas que optarem pelo pagamento em dinheiro vão receber 12,1184 euros por ação. O valor correspondente a R$ 32,71 ao câmbio de ontem, o que embute um prêmio de 20% em relação ao valor da ação em janeiro, quando a Arcelor Mittal fez sua primeira oferta hostil a Arcelor. O preço deixou, no entanto, os minoritários decepcionados, já que calculavam receber entre R$ 47 a R$ 52. Muitos já planejam até contestar a proposta, mas deverão esperar pela avaliação da CVM.
;
O presidente da autarquia, Marcelo Trindade, disse ao Valor que o pedido de registro de oferta será encaminhado para análise à área técnica, que terá 30 dias para se manifestar. A CVM pode fazer algumas exigências à Arcelor Mittal, como ajustes a documentos. Cumprido o prazo, a oferta é registrada e realizada. Este trâmite da entrega do pedido até a realização da oferta leva em média 90 dias, diz Trindade. Até ontem, a empresa não havia entregue a documentação para o registro na CVM por problemas de burocracia. Espera-se que o registro seja protocolado hoje.
;
A CVM, conforme esclareceu Trindade, examina a oferta toda para ver se ela está de acordo com a Lei das S/As e com o estatuto da Arcelor Brasil. Quanto ao preço da oferta, ele destacou que “a lei determina que a oferta seja feita por um valor que é 80% do preço que foi pago pela companhia brasileira”. O estatuto da Arcelor Brasil diz que os acionistas da companhia brasileira têm direito a 100% do que foi pago para o controlador. Indagado se a CVM poderia suspender uma oferta que contrariasse estes princípios, Trindade disse que não iria se pronunciar antes do pedido de registro ser examinado pela área técnica.
;
A proposta feita pela Arcelor Mittal prevê duas formas de pagamento: apenas em dinheiro ou em dinheiro e ações. No caso do pagamento em dinheiro, foi fixado um preço de ? 12,1184 por ação, equivalente a R$ 32,71. O valor foi estabelecido com base no Lajida (fluxo de caixa operacional) proporcional. Para chegar ao valor, é feito o cálculo do Lajida da Arcelor Internacional e, então, avalia-se qual a participação do Lajida da Arcelor Brasil no total. Com base nisto, chega-se ao valor da empresa, que é dividido pelo número de ações.
;
Se o acionista optar pela alternativa mista, o preço da ação pode ser o da cotação no dia 24 de outubro (R$ 39,50) ou à média da cotação dos últimos cinco dias do período final da oferta. Se todos optarem pelo pagamento em dinheiro, o máximo que a multinacional está disposta a desembolsar é 2,6 bilhões de euros ou US$ 3,27 bilhões (o equivalente a quase R$ 7 bilhões).
;
Em conferência telefônica, o vice-presidente da Arcelor Mittal, Aditya Mittal, disse acreditar que a CVM entenderá que a oferta é justa. “Não entendo como alguém poderá rejeitá-la. As pessoas (os minoritários) têm de entender que essa é uma oferta mandatória e não voluntária”, afirmou.
;
Apesar da confiança do vice-presidente, a contestação da oferta parece ser a tendência que será adotada pelos minoritários da Arcelor Brasil, como Previ, Dynamo, BNDES, Centrus e os fundos estrangeiros. Na avaliação da Previ, é preciso saber como a Arcelor Mittal calculou o preço da ação. Numa avaliação preliminar, a Previ observa que a empresa usou o Lajida e não o prêmio de controle sobre o valor de mercado da ação, como fizeram na oferta de ações da Arcelor Europa, em junho. Na ocasião, a Mittal pagou o valor de mercado da ação da Arcelor Europa mais 82% de prêmio aos acionistas.
;
Hoje, os minoritários esperam ter acesso aos laudos que a Arcelor Mittal entregou à CVM para avaliarem a metodologia do Lajida proporcional. “O valor é muito abaixo do que esperávamos. Com base no mesmo tratamento dado aos acionistas da Arcelor Europa chegamos a um preço de R$ 51 pela ação da Arcelor Brasil. Este preço está subavaliado”, disse um minoritário. Ele lembrou que, em último instância, os acionistas poderão não participar da operação, já que a oferta não é obrigatória.
;
O advogado Marcello Klug, sócio do escritório Albino Advogados Associados, que representa fundos estrangeiros minoritários da Arcelor Brasil, disse que os investidores podem ir à Justiça se não estiverem satisfeitos. Outro estrangeiro que já demonstrou descontentamento é Chris Hohn, diretor de gestão do fundo hedge The Children`s Investment Fund. “A oferta da Mittal viola os estatutos da unidade brasileira, que exige tratamento igualitário entre os acionistas do Brasil e do mundo”, disse o executivo, que pretende contestar a oferta.
;
Até o fim desse embate, as ações da Arcelor Brasil devem apresentar muita volatilidade na bolsa, apesar dos bons fundamentos da companhia, avalia Guilherme Marins, analista da Ativa Corretora. A empresa é produtora de aços longos, cuja demanda alta por conta do aquecimento do setor de construção civil, diz. “Mas, em momentos como este, os acionistas tendem a esquecer os fundamentos e o papel acaba sem rumo”, afirma.
;
No início do ano, a Mittal Steel anunciou a intenção de realizar uma oferta pública hostil aos acionistas da Arcelor, mas o Conselho de Administração da Arcelor se opôs. As duas empresas, entretanto, chegaram a um acordo no dia 26 de maio, numa “transação entre iguais”, na qual diziam estar realizando uma fusão. A partir daí, a Mittal realizou no exterior uma oferta pelas ações da Arcelor, mas considerou que não seria necessário fazer uma operação aqui. Desde então, os acionistas minoritários brasileiros travaram uma disputa com a Mittal Steel e com a Arcelor para terem direito ao “tag along” – receber o mesmo valor ou parte dele pago pelo novo controlador. A empresa alegava que houve fusão e não troca de controle – o que não obrigaria a realização de “tag along”. (Com agências internacionais)
Valor Econômico