Mineradoras descobrem potencial de Madagascar
22/03/07
The Economist22/03/2007
A sonolenta cidade de Fort Dauphin, sul de Madagascar, tenta recuperar o fôlego. Repousando sob o canto menos desenvolvido de um dos países mais pobres da África, Fort Dauphin, também conhecida como Tolagnaro, é acessível apenas por avião ou por estradas sujas e arruinadas. Recentemente, no entanto, veículos com tração dupla tornaram-se comuns e os moradores locais passaram a congregar-se na praça principal para ver guindastes e caminhões de carga em pleno trabalho no pequeno porto, mais abaixo. Chegaram centenas de pessoas do exterior e do resto do país. Os poucos hotéis da cidade estão repletos e os preços da comida e aluguéis dobraram nos últimos 12 meses. Por que? Porque a gigante mineradora mundial Rio Tinto começou a operar uma grande mina, logo nas aforas da cidade.
O projeto vinha sendo cogitado desde os anos 80, mas foi apenas em 2005, com a alta das commodities, que a Rio Tinto decidiu investir US$ 650 milhões no que se acredita ser o maior depósito de ilmenita do mundo. A mina deverá fornecer 10% da oferta mundial do mineral, que contém óxido de titânio e é usado para fabricar pigmentos e filtros solares entre outros produtos. Antes, a empresa, em empreendimento conjunto com o governo, ávido por atrair investimentos estrangeiros após décadas de isolamento, precisará construir estradas, um novo porto e infra-estrutura de água e energia. Parte disso beneficiará Fort Dauphin, que carece de água encanada e uma rede elétrica confiável. A mineradora também vem ajudando os locais com campanhas educativas para prevenção do HIV/aids.
Há mais interessados em Madagascar. Um consórcio liderado pela canadense Dynatec investirá cerca de US$ 2,5 bilhões em uma mina de níquel e cobalto. A sul-africana Exxaro pretende desenvolver outro depósito de ilmenita. Há informações de que a Alcan procura depósitos de bauxita perto de Fort Dauphin. Várias outras empresas menores procuram reservas de platina, ouro e urânio. A Exxon Mobil e outras prospectam petróleo tanto na ilha como no fundo do mar, embora as perspectivas ainda sejam incertas.
Madagascar também possui ricos veios de pedras preciosas, o que levou alguns locais de poucos recursos a testar a sorte. Jean-Noël Andrianasolo é um deles. Em 1998, deixou a mulher e filhos para dirigir-se ao sul, em busca de safiras. Não foi o único. A corrida transformou uma área de savana antes isolada, à beira de um parque nacional, em um assentamento conhecido como Ilakaka. Ao longo da estrada principal, negociantes de gemas do Sri Lanka e Tailândia montaram lojas e algumas poucas edificações surgiram, ao lado das cabanas de madeira.
Andrianasolo encontrou a riqueza, mas a maioria dos demais, não. No mercado local, mineradores informais, empoeirados e com mãos calejadas, vendem pedras aos negociantes locais, em situação pouco melhor. Há alguns quilômetros, mineradores escavam em poços precários, com dez metros de profundidade, em busca das safiras. Algumas vezes, acabam enterrados vivos.
A bonança mineral poderia ser de grande valia para os cerca de 18,6 milhões de habitantes de Madagascar, onde a renda média anual é de US$ 290. Os setores de mineração e petróleo, que representam menos de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) atualmente, poderiam triplicar de peso até 2011. Alguns temem que a mineração possa desencadear tensões políticas e problemas de corrupção, além de prejudicar o ecossistema único do país. O presidente Marc Ravalomanana, um empresário magnata, reeleito em dezembro, parece determinado a evitar essas armadilhas. Foram abandonadas as concessões de exploração nebulosas e adotou-se um sistema mais aberto. Novas leis criaram condições mais previsíveis e favoráveis para investimentos. O tráfico de gemas diminuiu e foi criada uma escola de gemologia e lapidação para ampliar o valor das exportações. O governo espera juntar-se a uma iniciativa global para promover a transparência na indústria extrativista, antes de a produção em larga escala começar.
Martin Nicol, do grupo ambiental WWF, admite que a mineração não é necessariamente incompatível com a preservação do meio ambiente. Em 2003, o governo decidiu triplicar a área de florestas protegidas e as grandes mineradoras ocidentais têm interesse em serem vistas fazendo sua parte. Na verdade, os desmatamentos e queimadas de áreas para uso agrícola, e não a mineração, são os principais responsáveis pelos danos. À medida que Madagascar tenta fazer o seu melhor para superar anos de má administração e políticas marxistas, o verdadeiro teste ainda está por vir: mesmo com todas as boas intenções, será que o governo conseguirá manter-se íntegro quando o dinheiro começar a entrar?
Valor Econômico