Imposto para exportar minério: ideia perigosa
27/04/10
Em consequência do aumento expressivo dos preços das commodities de natureza mineral, em especial a de minério de ferro ao longo dos últimos anos e neste, em particular função da forte demanda chinesa, o governo indiano, por iniciativa de seu Ministério das Finanças, anunciou no final do ano passado a imposição de um imposto específico, no valor de 5%, sobre as exportações de minério de ferro do tipo fino, e uma alíquota de 10% sobre as exportações de minério granulado. Isso deve constituir uma arrecadação de 4% a 5% por tonelada ao custo do produto exportado pela Índia e quase todo consumido pela China.
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A princípio, tal aumento não tem fortes impactos no nível de preços do mercado global de minério de ferro, parece mais uma taxa de equalização do preço do minério indiano aos preços do minério brasileiro e australiano, em função da vantagem competitiva logística que a Índia tem decorrente de um custo menor no frete de seu produto por sua localização geográfica no continente asiático O tema passaria despercebido no Brasil se não houvesse o projeto de lei número 6633/09 em trâmite na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Carlos Brandão (PSDB-MA) que estabelece alíquota fixa de 10% de imposto para a exportação de minério, concedendo ao Poder Executivo, em seu artigo segundo, poder para, eventualmente, ampliar esse valor.
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Justificando seu projeto, o autor cita que o Brasil é o segundo maior produtor de minério de ferro, atrás apenas da China, e argumenta que a produção doméstica foi em 2008 de 409 milhões de toneladas, o equivalente a 20% do produção mundial.
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O texto de justificativa acrescenta ainda que, enquanto as exportações brasileiras, com 2008 como referência, foram de 298 milhões de toneladas, equivalentes a um valor FOB de US$ 16 bilhões, o que representa um aumento de 11% em quantidade, e de 52% de valor nas exportações.
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O texto também explora o possível diferencial entre a exportação de minério de ferro e a baixa capacidade instalada das siderurgias brasileiras, de apenas 41,5 % de toneladas de aço bruto.
Segundo o autor, este diferencial entre o minério extraído e o industrializado é desfavorável ao Brasil, por não agregar valor às nossas exportações.
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O deputado afirma no texto que, no terceiro trimestre de 2009, cerca de 70 milhões de toneladas de minério de ferro e pelotas foram exportados por uma única empresa. Para argumentar, cita o exemplo de que uma determinada siderúrgica brasileira compra, anualmente, cerca de 7 milhões de toneladas de minério de ferro fino por R$ 210 milhões, e recebe R$ 1,8 bilhão pela exportação de suas placas. Segundo o autor, haveria um ganho de R$ 1,5 bilhão.
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A bem da verdade econômica, a história não é bem essa, pois neste diferencial está o custo da energia ? intensiva no caso os valores do investimento em altos fornos e na aquisição e investimento em plantas inteiras para a elaboração de placas de aço.
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Se contarmos o valor adicionado por unidade de fator de produção ao longo da escala de produção, vamos ver que a rentabilidade líquida do negócio não apresenta grandes distorções em relação às atividades industriais ? margens de 8% a 10% (descontados os impostos).
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O assunto não produziria maiores impactos se não fosse a nota do respeitado jornalista Guilherme Barros, em sua Coluna no IG.com, que apresenta a ideia, o conceito, e a forma da taxação sobre as exportações de minérios de ferro para ainda este ano (imposto sobre a exportação não obedece ao princípio da necessidade constitucional de anualidade para a incidência).
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O jornalista avalia a questão como fato já decidido, e com apoio dos Ministérios da Fazenda e de Minas e Energia.
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Hoje, a exportação de minério de ferro é isenta de tributação no Brasil .
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Todos sabemos que a tomada de decisões de tal natureza pela equipe econômica do governo será muito difícil, tal é a complexidade do assunto em tela e os contratos de oferta firme já firmados entre empresas brasileiras e empresas de fora do Brasil.
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Haverá prejuízos, advindos de possíveis adimplementos de tais contratos, por força superveniente à vontade das partes, fora os efeitos destruidores do patrimônio societário e desvalorização das cotações das ações de empresas produtoras e exportadoras de tais commodities, cotadas nos mercados bursáteis aqui e no exterior.
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Como economista especializado em macroeconomia e finanças, eu teria uma grande cautela na tomada de decisões sobre esse tema, dada a diversidade de efeitos colaterais. Mas creio, e de fato é verdadeiro, que o conjunto de informações à disposição das autoridades econômicas e monetárias é maior que o meu, por definição. Contudo, acredito que o tema deveria ser mais explorado e analisado com as devidas ressalvas, incluindo nestas variáveis o efeito intervencionista do Estado e seus impactos negativos e positivos. O ministro Guido Mantega é extremamente competente, e tem demonstrado ser cauteloso no lidar com temas desta magnitude, sempre olhando sobre uma ótica mais ampla e complexa. Até porque os sinais emitidos agora podem ser indicadores de interpretações equivocadas pelos agentes econômicos, com consequente impacto sobre a aceitabilidade da candidata Dilma Roussef no meio empresarial.
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Este ambiente não admite medidas unilaterais e intervenções no livre funcionamento dos mercados, em especial no comércio externo. Mas calma e temperança são dois grandes instrumentos dos estadistas, o que é sem dúvida o caso de nosso ministro da Fazenda
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Renê Garcia Jr tem mestrado e doutorado pela EPGE/FGV e é sócio-diretor da RGAssociados
Jornal do Brasil