Gigante do níquel
25/10/06
Com aquisição do controle da mineradora canadense Inco, Vale do Rio Doce assume a segunda maior produtora e dona das principais reservas do metal no mundo, cujos preços dobraram este ano
;
Luís Osvaldo Grossmann Marcelo Tokarski
Da equipe do Correio
;
A gigante do ferro Companhia Vale do Rio Doce colecionou ontem uma série de resultados positivos no rastro da compra da canadense Inco, que catapultou-a para o segundo lugar entre mineradoras mundiais. Além do negócio em si ? que fortalece a internacionalização da Vale e diversifica seu portfólio com a maior reserva de níquel do planeta ?, a companhia teve ações valorizadas em 4,63% em um único dia, protagonizou a mais importante operação financeira com múltiplos bancos já realizada em países emergentes e concluiu a maior aquisição feita por uma empresa latino-americana.
;
A compra da canadense Inco foi celebrada por analistas como um lance acertado da Vale, como a própria valorização dos papéis da empresa sugere. Mais do que isso, reduz o peso dos negócios com minério de ferro ? ainda carro-chefe da empresa ? e agrega valor à rede de distribuição que já possui. O presidente da Vale, Roger Agnelli, ressalta que a compra permite o abastecimento de níquel juntamente com ferro a clientes já existentes. Não é pouco, especialmente tendo em vista a impressionante valorização do mineral nos últimos anos ? só em 2006 o níquel dobrou de valor, e quadruplicou desde 1990.
;
?É um negócio com ganhos de economia de escala, que aumenta a flexibilidade da produção em custos e logística e de onde se pode tirar benefícios da rede já instalada e com uma fonte adicional de receitas. Sem contar que há um cenário de condições favoráveis de demanda e de preços?, diz o sócio da área de Corporate Finance da KPMG, Cláudio Ramos.
;
Nova fonte
;
A aquisição da Inco faz com que o níquel seja a segunda maior fonte de faturamento da Vale. A própria companhia brasileira estima que as vendas do metal responderão por 20% da receita, enquanto a participação do minério de ferro cairá de 74% para 56% do faturamento. Por enquanto, a Vale se torna a segunda maior produtora de níquel do mundo ? utilizado especialmente para a fabricação de aço inoxidável, mas também em baterias, CDs e DVDs e computadores ? mas a Inco lhe garante também as maiores reservas mundiais do metal, estimadas em 7,8 milhões de toneladas. Dos cinco maiores depósitos de níquel em fase de desenvolvimento, a Vale controlará quatro.
;
?A compra é importante para a empresa e para o Brasil. O níquel é um mineral estratégico para qualquer nação. A Inco tem 104 anos de atividade e detém tecnologia de ponta, que será transferida para o Brasil. Além disso, com o ingresso desta gigante brasileira no mercado canadense, empresas brasileiras fornecedoras de máquinas e equipamentos e também prestadoras de serviços passarão a atuar naquele mercado e nos Estados Unidos?, afirma o presidente do Instituto Brasileiro de Mineração, Paulo Camillo.
;
Segundo a Vale, a entrada no mercado de níquel permitirá atender a demandas diferenciadas tanto dos mercados emergentes, quanto dos países desenvolvidos. O primeiro grupo de nações deve ampliar o consumo do produto para suprir suas necessidades de infra-estrutura, construção civil e indústria automotiva, entre outros. Já nos países mais ricos, o níquel deve ser cada vez mais consumido pelo setor aeroespacial, produção de computadores, veículos elétricos híbridos e telefones celulares, por exemplo.
;
Sobra dinheiro
;
O negócio tinha contornos tão bons que nada menos que 34 bancos se ofereceram a emprestar o dinheiro necessário ? até agora, US$ 13,4 bilhões por 75,6% das ações da Inco. Mas a Vale quer 100% e prorrogou para 3 de novembro o prazo na esperança de que outros acionistas decidam vender seus papéis.
;
Mesmo as avaliações iniciais de que o financiamento feito para comprar a Inco amplia o endividamento da empresa parecem ter tido impacto reduzido e as agências de riscos já avaliaram a nova situação (leia próxima matéria).
;
Criada em junho de 1942 pelo governo brasileiro, a Companhia Vale do Rio Doce foi privatizada em maio de 1997. Já no ano seguinte o lucro da empresa cresceu 46% e em 1999 bateu recorde de ganho até então, R$ 1,2 bilhão. No ano passado, tornou-se a primeira empresa brasileira com nota de risco superior à do país-sede e a única a contar com este reconhecimento por três diferentes agências de rating. Desde 2000, as aquisições da companhia somavam US$ 3,1 bilhões.
;
Salto para US$ 77 bi
;
Os US$ 18 bilhões que a Vale vai pagar pela canadense Inco equivalem a praticamente seis vezes o valor que foi pago ao Estado no leilão de privatização da companhia. Em maio de 1997, o governo FHC vendeu a empresa para um consórcio liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) ? a mudança acionária foi feita em 2001, quando o Bradesco e a Previ assumiram o controle da Vale. Foram pagos R$ 3,3 bilhões, valor que ao câmbio da época equivalia a cerca de US$ 3 bilhões. Após a compra da Inco, a empresa passará a valer US$ 77 bilhões.
;
O negócio também é de causar inveja à maioria das empresas brasileiras. Os US$ 18 bilhões seriam suficientes para a segunda maior empresa brasileira (perde apenas para a estatal Petrobras) comprar, de uma só vez, a própria e a siderúrgica Gerdau, duas gigantes do setor. Se voltasse seus canhões para o mercado financeiro, a Vale poderia colocar no seu carrinho de compras dois dos principais bancos do país: Unibanco e Banespa. As comparações são feitas com base em ranking elaborado pela consultoria Economática.
;
No entanto, até agora a Vale conseguiu a aprovação para comprar apenas 75,66% das ações da Inco. O valor é de US$ 13,4 bilhões, suficiente para comprar, por exemplo, as duas principais companhias aéreas do país (TAM e Gol), além da locadora de carros Localiza. O valor desembolsado também seria suficiente para comprar a Siderúrgica Nacional e a Telemar, uma das principais concessionárias de telefonia do Brasil. Ou ainda a Usiminas e a fabricante de cosméticos Natura. (MT)
;
Empresa deve continuarse valorizando em 2007
;
Expectativa de analistas de mercado é que as ações da Vale do Rio Doce, hoje cotadas em R$ 45 na Bovespa, superem os R$ 73
;
Marcelo Tokarski e Luís Osvaldo Grossmann
Da equipe do Correio
;
Apesar do forte aumento no seu nível de endividamento, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) deve continuar atraindo a atenção de investidores. A queda no preço de suas ações, ocorrida após o anúncio da oferta pela Inco, ainda em agosto, já foi inteiramente absorvida pelo mercado, tanto que desde então as ações da mineradora acumulam alta superior a 12%. Por isso, estimam os analistas, continua sendo interessante adquirir ações da companhia. A expectativa é de que dentro de 12 meses o papel preferencial, que ontem fechou cotado a R$ 45,81 na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) , supere a casa dos R$ 73, o que representaria uma valorização de quase 60% em um ano.
;
Cristina Viana, analista de mineração da Ágora Sênior, diz que ?a Vale do Rio Doce vai colher os louros dessa aquisição por muito tempo?. ?O preço de US$ 18 bilhões (pago pela Inco) é elevado, mas já tinha impactado no valor das ações em agosto, quando a oferta pública foi feita. Ou seja, a partir de agora as ações vão só se valorizar?, afirma. No dia 11 de agosto, quando a Vale anunciou a intenção de comprar a Inco, suas ações com direito a voto (ordinárias) fecharam em baixa, cotadas a R$ 48,40. Ontem, essas mesmas ações valiam R$ 54,40, um ganho de 12,6% em pouco mais de dois meses. ?Nós mantivemos e reforçamos a recomendação de compra das ações da Vale.?
;
De acordo com outro analista consultado pelo Correio, a diversificação dos negócios da Vale, antes muito concentrados no minério de ferro, vai beneficiar a empresa, que passa a ficar menos dependente das oscilações de uma mesma commodity. Ontem, as ações da empresa fecharam em forte alta. Os papéis com direito a voto subiram 4,63%, enquanto as ações ordinárias valorizaram 3,34%. Aliado à alta de 2,39% nas ações da Petrobras (leia ao lado), o desempenho impulsionou a Bolsa de Valores de São Paulo, que fechou na maior pontuação em cinco meses. O Ibovespa subiu 0,69%, atingindo 39.498 pontos, maior patamar desde 12 de maio, quando marcou 40.211 ? as mineradoras e petrolíferas respondem por 30% do Ibovespa.
;
Ontem, duas agências de classificação de risco tiveram comportamentos distintos em relação à Vale. A Fitch manteve em ?BBB-? o rating em moeda estrangeira e diminuiu para ?BBB-? a classificação em real. No entanto, as duas classificações continuam indicando grau de investimento (?prudente ou seguro?), o que possibilita à Vale contrair empréstimos a juros menores. Já a Standard & Poor?s reduziu a classificação da Vale de ?BBB+? para ?BBB-? ? ainda dentro do grau de investimento. O banco de investimentos norte-americano Merrill Lynch manteve os papéis da Vale em sua Focus List, que recomenda a investidores as oito ações mais rentáveis do mercado brasileiro.
;
Internacionalização é tendência
;
Mariana Flores
Da Equipe do Correio
;
A aquisição da mineradora canadense Inco pela Companhia Vale do Rio Doce reforça a estratégia da empresa de internacionalizar seus negócios. A companhia aparece em terceiro lugar em um ranking das maiores transnacionais brasileiras que será apresentado hoje pela Fundação Dom Cabral em um seminário na Columbia University, em Nova York. Em sua frente constam apenas a Gerdau e a Construtora Norberto Odebrecht. A lista contém 24 empresas no total.
;
A grande maioria concentra sua inserção no mercado externo pelas exportações, como a própria Vale e a Embraer, que aparece em 9º lugar. Já outras, mesmo sendo de menor porte, encostam nas gigantes quando o assunto é internacionalização, por investirem em filiais e subsidiárias no exterior.
;
Alguns exemplos são a escola de línguas Fisk e a Datasul, que desenvolve softwares de gestão empresarial. Elas aparecem em 13º e 19º lugar, respectivamente, à frente, por exemplo, da Votorantim Celulose e Papel e da Natura. “Internacionalização não depende de tamanho, depende da ousadia”, afirma o professor da Fundação Dom Cabral, Álvaro Cyrino, um dos responsáveis pela elaboração do ranking.
;
Pouco mais de vinte anos após iniciar sua atividade no exterior, a rede Fisk já possui 105 unidades fora do Brasil. Só na Argentina são 82. Juntas, as unidades no exterior respondem por 15% do faturamento total do grupo, que soma 755 escolas no Brasil. A expansão, no entanto, não se deu pela saturação do mercado brasileiro, segundo o executivo de Marketing do grupo, Christian Ambros. De acordo com ele, ainda há espaço para cerca de 250 novas unidades dentro do Brasil.
;
A saturação do mercado interno também não foi o motivador da Datasul, segundo o diretor de novos negócios da empresa, Paulo Caputo. “Ainda temos muitas oportunidades no Brasil, mas temos nos outros países também. A internacionalização não é uma escolha, é uma obrigação para as empresas de software, elas não podem ficar presas a um mercado só”, afirma. Das 37 franquias de distribuição do grupo, seis estão fora do Brasil.
;
Em contrapartida, a fabricante gaúcha de carrocerias de ônibus, Marcopolo, se voltou para o exterior por já possuir metade do mercado nacional do segmento. Atualmente, já soma 84 países consumidores de seus produtos e seis fábricas fora do Brasil. No próximo ano entram em funcionamento duas novas unidades, uma na Rússia e outra na Índia “Estamos sempre perseguindo novos mercados ao redor do mundo”, afirma o diretor de relacionamento com os investidores, Carlos Zignani.
Correio Braziliense