Entrevista: novo código mineral só sai em 2011, diz diretor do DNPM
24/04/10
Com otimismo e um pouco de sorte, o projeto do novo Código Mineral brasileiro elaborado pelo Executivo poderá ser aprovado pelo Congresso Nacional daqui a um ano. Esta é a avaliação de Miguel Antonio Cedraz Nery, diretor-geral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão que se transformará em agência reguladora com a entrada em vigor do novo marco regulatório.
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Mesmo assim, na análise de Nery feita à jornalista Célia Froufe, da Agência Estado, o ?sim? dos parlamentares estará sujeito a acordos. Um dos pontos nevrálgicos do documento é o prazo determinado de até 30 anos para a concessão de lavras. ?Podem querer resistir ao prazo de concessão, para que não haja esse prazo, o que não vai ter acordo?, afirmou.
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?Mas pode-se tentar construir alguma solução?, considerou em seguida. Apesar de o governo não querer abrir mão de um limite de tempo para a exploração dessas terras, o prazo só será estipulado para as novas concessões. O diretor descartou a discussão de aumento dos royalties cobrados para a exploração antes de um ajuste da carga tributária. E criticou as exigências para a concessão de licenças ambientais.
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?Se existe um gargalo que temos hoje são as licenças ambientais?, disse. ?Tem coisas quesão ridículas?, acrescentou. Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
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Agência Estado – Qual é sua expectativa para que o projeto do marco regulatório, que está na Casa Civil, seja levado ao Congresso?
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Miguel Antonio Cedraz Nery – Minha expectativa é que se conclua a discussão neste semestre e que, no segundo, o Executivo encaminhe o projeto ao Legislativo. Espero que se arredonde o projeto entre o Ministério (de Minas e Energia – MME), Casa Civil e também o Planejamento neste primeiro semestre.
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AE – Que pontos precisam ser arredondados?
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Nery – O projeto está pronto na Casa Civil, que o está estudando. Depois haverá uma discussão com o MME. Se me perguntar o que é que tem a ser arredondado, digo que nada. A Casa Civil costuma questionar pontos que geram incertezas, instabilidade institucional. A regulação setorial nós conhecemos mais do que eles, mas garantir as condições e manter estabilidade institucional, é com eles. A Casa Civil vai exaurir qualquer dúvida para não deixar brechas.
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AE – Mas é difícil pensar em uma votação no período eleitoral?
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Nery – Sendo otimista, acredito que a gente possa, ao longo do segundo semestre, discutir com parlamentares e, passada a eleição e havendo um acordo entre as parte interessadas, levar à votação. Se o setor privado não oferecer resistência a ponto de algunsparlamentares criarem obstáculos, vejo a possibilidade de ser votado na Câmara no segundo semestre e, no primeiro semestre de 2011, no Senado. Mesmo que a oposição ganhe a eleição. Independente do resultado, haverá distensão da disputa e passa a prevalecer o interesse do País. Não tendo cavalo de batalha por qualquer segmento, o processo pode ser votado. O DNPM pode entrar pesado com o nível de articulação política que a gente tem dentro do Congresso, mas não tenho governabilidade sobre o nível de resistência de alguns segmentos. Sei de alguns pontos que não serão consensuais no encaminhamento.
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AE – Quais são eles?
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Nery – Podem querer resistir ao prazo de concessão, para que não haja esse prazo, o que não vai ter acordo. Mas pode-se tentar construir alguma solução.
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AE – O prazo é a pedra no sapato do projeto?
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Nery – Há soluções. Os direitos atualmente existentes não seriam alterados. As concessões que não têm prazo continuarão sem prazo.
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AE – A nova regra do jogo valerá, então, só daqui para frente.
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Nery – Isso. Valerá daqui para frente. Não retroage. Isso já é uma sinalização, mas não haverá acordo se quiserem manter para tudo. Isso não impede, porém, que se construa uma solução. O governo encaminhará o projeto com prazo porque essa é a posição do governo.
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AE – Mas havia um acordo entre o Executivo e o Legislativo para votação de projetos do pré-sal, e mesmo assim a votação continua parada?
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Nery – Em política, não se tem uma total governança sobre o processo.
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AE – E a questão dos royalties? Pode vir a ser um problema?
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Nery – Não, porque já saiu do texto e não está vinculada. A pretensão é caminhar sem eles.
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AE – Mas o próprio governo avalia que os royalties cobrados hoje são baixos. O ex-ministro do MME Edison Lobão falava isso. Como o senhor avalia?
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Nery – É preciso fazer uma discussão de maior profundidade. Acho complicado mexer nos royalties sem considerar a carga tributária. As alíquotas, em alguns países são mais altas, mas aqui, por exemplo, o carro-chefe da arrecadação são os metálicos? Prefiro não adiantar, mas participei de discussões e tem um encaminhamento para ser discutido com o Ministério da Fazenda. A percepção do governo é que os royalties, apesar de não representarem um tributo, oneram.
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AE- Para o DNPM, a principal mudança prevista no projeto é a sua transformação em agência reguladora?
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Nery – A principal mudança é o paradigma da gestão mineral. A agência reguladora é uma decorrência dessa mudança. Hoje temos um código de mineração de um contexto de 1934, quando o que se imaginava era fomentar a mineração. Não havia uma indústria mineral. O código é tão arcaico que animais constam do patrimônio da concessão de lavra. Burros eram patrimônio, e não um equipamento, uma retroescavadeira. Nem garimpo usa burro hoje! Hoje temos uma economia mineral forte e empresas com disponibilidade de tecnologia e capital que condicionam o poder público a ter outro paradigma de administração.
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É um processo extremamente burocrático para dar uma concessão de lavra. E para tomar, é pior ainda. A condição básica é fazer três autuações com multa no intervalo de um ano, sendo obrigado a ser advertido antes. Agora queremos simplificar. Isso sem dizer que as multas são irrisórias. Há multas de R$ 1 mil. As sanções hoje previstas na legislação não desencorajam o mau minerador a inadimplir perante a lei. O DNPM não é um órgão de fomento? Não. Cada vez mais o DNPM está se transformando em um órgão mais de regulação para a transição. Estamos transformando o DNPM, estamos arredondando a bola para quando a agência vier, fazer o gol.
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AE – Há, realmente, muitas empresas ?sentadas? em minas sem explorá-las?
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Nery – Tem um contexto da silvinita, no Amazonas, e têm o do grande decretode 50 mil hectares, em Sergipe, ambos da Petrobras. Temos discutido com a arrendatária, que é a Vale, o esforço que terá de fazer para colocar em lavra aquelas jazidas.
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AE – O novo projeto não considera a volta da estatização?
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Nery – O setor de mineração no Brasil foi estatizado por muito tempo. Não se fala nisso, não.
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AE – E as ações do Meio Ambiente? São prejudiciais ao setor?
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Nery – Sem dúvida nenhuma. Se existe gargalo hoje são as licenças ambientais, que acabam levando o processo a ser extremamente moroso. Há problemas como topo e encosta de morro, cavernas? O nível de restrição ambiental é grande. Mas é preciso perceber que, no passado, toda a atividade degradava, não só mineração. Hoje tem tecnologia, é diferente. Tem coisas que são ridículas. O tema é palpitante.
Agência Estado