Elas querem conquistar o mundo
05/10/06
Amauri Segalla
No mês de setembro, a Companhia Vale do Rio Doce provocou um alvoroço no mundo dos negócios. O anúncio da oferta para a compra da canadense Inco chamou a atenção por duas razões principais. A primeira delas é que se trata de uma empresa de um país emergente interessada em adquirir o controle de uma corporação de Primeiro Mundo. O outro motivo é ainda mais emblemático. A oferta de US$ 17,8 bilhões constitui-se no maior valor já oferecido por uma empresa latino-americana para adquirir outro ativo. Caso a transação seja efetivada – a definição deve sair nos próximos dias – o valor de mercado da Vale passará dos atuais US$ 59,8 bilhões para US$ 77 bilhões, transformando-a na segunda maior mineradora do mundo. De quebra, ao incorporara a Inco, líder na extração de níquel, a Vale não só se diversificará como reduzirá sua dependência do minério de ferro. A investida mais ousada da Vale no mercado internacional é um sintoma do avanço de algumas grandes empresas de um punhado de economias em desenvolvimento, que começam a chamar a atenção num mundo hegemonizado pelas multinacionais americanas, européias e japonesas. Esse novo fenômeno foi analisado num estudo da consultoria americana Boston Consulting Group (BCG), que destacou um grupo de 100 companhias oriundas de países emergentes, batizadas de novas desafiantes globais. ?Essas corporações, inclusive, já ameaçam seriamente as multinacionais tradicionais?, diz Marcos Aguiar, diretor da BCG, um dos autores do estudo. De acordo com o trabalho, as 100 companhias listadas faturaram, juntas, US$ 715 bilhões em 2004, o equivalente ao PIB do México. Em 2010, segundo projeções da BCG, as desafiantes dobrarão o seu faturamento, graças ao intenso processo de internacionalização. No máximo em quatro anos, a continuar o atual ciclo de expansão, suas receitas no mercado externo deverão crescer de 28% para 40% das vendas totais. E praticamente a totalidade delas estará entre as líderes mundiais em seus setores de atuação, prevê o BCG. INVESTIMENTOS RECORDESOutro dado surpreendente é o ritmo de crescimento das emergentes. Em média, suas receitas evoluem a uma taxa anual de 24%, algo bastante raro no universo empresarial. Esse desempenho tem permitido o aumento brutal dos investimentos das emergentes. De 1995 a 2003, segundo o Banco Mundial (Bird), triplicaram os aportes corporativos de nações em desenvolvimento para outros países. No ano passado, chegaram a US$ 47 bilhões.Há 12 brasileiras (Petrobrás, Embraer, Vale do Rio Doce, Embraco, Votorantim, Coteminas, Weg, Braskem, Gerdau, Sadia, Perdigão e Natura) no grupo das 100 emergentes globais. A China, dona da economia que mais cresce no mundo, é a recordista de representantes, com 44 corporações na lista. Entre elas, a Lenovo, fabricante de computadores que, em 2005, comprou, por US$ 11 bilhões, o negócio de PCs da IBM. Depois vem a Índia, à frente do Brasil, com 21 empresas, Rússia (7 ) e México (6). Entre as brasileiras, a Vale pode ser considerada uma veterana no mercado global. Possui escritórios e operações em 17 países e 85% de suas receitas são em dólares. No ranking das mais globalizadas, a liderança pertence à Embraer, que tem 93% do faturamento em moeda estrangeira. ?Nosso projetos são todos voltados para o mercado internacional?, diz Frederico Curado, vice-presidente e que no ano que vem assumirá o comando da Embraer com o desafio de mantê-la entre as três maiores fabricantes de aeronaves do planeta. Para a BCG, as campeãs emergentes estão se tornando tão inovadoras e capacitadas tecnologicamente quanto as grandes multinacionais de países desenvolvidos. Outro ponto favorável é a gestão das companhias desafiantes, baseada na busca incessante por novos mercados. ?Elas passaram rapidamente de coadjuvantes para competidoras de primeira linha?, diz Aguiar, da BCG. Exemplo disso é Votorantim Cimentos, um dos braços do Grupo Votorantim. Acossada pela estagnação do mercado interno, a empresa partiu com apetite, no início da década, para o exterior. Em apenas cinco anos, a despeito da entrada tardia no mercado externo, montou um portfólio composto por 7 fábricas de cimento e 39 usinas de concreto nos EUA e Canadá. ?É pouco, queremos mais?, diz Raul Calfat, diretor-geral da Votorantim. A exemplo da Votorantim, as novas multinacionais prometem fazer muito barulho no futuro próximo. O Bird estima que, em 10 anos, a participação de nações em desenvolvimento no PIB mundial deverá passar dos atual um quinto do total para um terço. Esse crescimento será alavancado principalmente pelas companhias que rapidamente se tornaram desafiantes globais.