Como transformar ferro em ouro
04/04/08
As condições operacionais precárias, aliadas ao baixo preço do minério, por ter qualidade inferior, levaram muitos mineradores a desistir do negócio na região mineira de Serra Azul. O processo de concentração desse minério era caro e existia oferta de produtos mais nobres. O minerador José Mendes Nogueira, 82 anos, que já era proprietário da Mineração J. Mendes na região, aproveitou a oportunidade para adquirir as minerações Somisa e Global. Somadas, a sua capacidade de extração do minério subiu para 5 milhões de toneladas anuais.A partir de 2002, a situação melhorou drasticamente com a maior importação chinesa. Mesmo a Companhia Vale do Rio Doce, que adquiria quase todas as grandes minerações do estado, não conseguia atender as encomenda. A Vale adquiriu a Samitri, metade da Samarco, as Minerações Brasileiras Reunidas e a Ferteco, entre outras. Também deflagrou um arrojado programa de expansão dessas minas mas, ainda assim, foi obrigada a adquirir a produção de pequenos mineradores para atender aos crescentes pedidos. Em outubro de 2004, a Vale assinou contrato para adquirir, por oito anos, quase toda a produção da J. Mendes.Comentou-se, na época, que a Vale não se interessara pelo controle acionário por acreditar que a demanda seria atendida com gigantesca ampliação em suas minas. Uma delas, Brucutu, passou de 5 milhões para 30 milhões de toneladas em 24 meses. Não foi suficiente. As importações de minério continuaram crescentes e em poucos anos, a produção mineira subiu de menos de 50 milhões de toneladas para mais de 200 milhões anuais. O preço do minério subiu ainda mais e passou, na boca da mina, de US$ 3 para mais de US$ 40 a tonelada.Nesse cenário, Minas se destacava, por conta de sua condição de maior província mineral do mundo. Ao mesmo tempo, a qualidade do seu minério não encontra comparação no mundo. Depois de adquirir todas as boas reservas existentes no estado, os compradores voltaram-se, então para Serra Azul, onde estavam, até então, as desprezadas jazidas de Zé Nogueira. Primeiro, a London Mining adquiriu a mineração Itatiaiuçu por cerca de US$ 130 milhões. O preço foi considerado demasiado alto, em decorrência das dificuldades para se extrair, concentrar e transportar o minério. Mas a perplexidade foi superada poucos meses depois, em julho de 2007, quando a MMX Mineração, de Eike Batista, adquiriu por cerca de US$250 milhões, a AVG Mineração, da mesma região.No dia 31 de janeiro foi a vez do experiente José Nogueira se desfazer de seu negócio, transformando-se em um bilionário e surpreendendo mais uma vez o já desorientado mercado. A solenidade foi realizada na presença dos cinco filhos, genros e noras, já que a empresa é familiar. A esse contigente somaram-se netos e bisnetos, pois eles aproveitavam a viagem para seguir para uma pequena cidade do Sul da Bahia, onde habitualmente passam férias. O bilionário preferiu sair de férias imediatamente, pois o feriado do Carnaval, só ocorreria dois dias depois. “Fiz as contas e resolvi antecipar a viagem para economizar dinheiro com hospedagens” declarou aos presentes na ocasião em que recebeu os US$ 925 milhões, cifra que ainda poderá dobrar de acordo com os estudos em andamento.Nogueira voltou das férias para Itaúna, mas não quer ser fotografado. Teme ser seqüestrado. Mas continuará na mineração. ´É ainda proprietário de uma pequena mas valiosa jazida à;s margens da rodovia que liga Belo Horizonte ao Rio, vizinha da Ferteco. A exploração do minério está arrendada à; Vale.Em sua breve fala na solenidade, realizada na Usiminas, explicou as razões para se desfazer de um negócio que lhe pertencia havia 40 anos. Disse ao presidente da siderúrgica, Rinaldo Campos Soares, que sua capacidade de extração é pequena e admitiu que não dispunha de recursos para construir um ramal ferroviário com custo estimado em mais de US$ 50 milhões. Nem de dinheiro para construir uma usina de pelotização para concentrar seu pobre minério de ferro. Falta-lhe, também, experiência de negociações no mercado internacional. “Se eu me agarrar a essas jazidas, sempre esperando por preços melhores, corro o risco de tudo perder, com graves prejuízos para minha família.”
Gazeta Mercantil