Carlos Minc: O verde que amadureceu
22/02/07
Com pouco mais de um mês como secretário de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, o ex-ecoxiita Carlos Minc já aprovou mais de 100 projetos de empresas
Eduardo Monteiro
Minc: “Sou midiático, mas sempre fui de negociar”
Por;Malu Gaspar
EXAME;O carioca Carlos Minc Baumfeld, de 55 anos, tornou-se conhecido no Rio de Janeiro como um daqueles ambientalistas ruidosos que abraçam árvores e jogam tomate podre em casacos de pele. Nos últimos 20 anos, em cinco mandatos de deputado estadual (está licenciado do sexto mandato), Minc construiu uma carreira política recheada de protestos, projetos de lei com tônica ambiental e brigas com empresas acusadas de ser poluidoras. Em 1999, por exemplo, ele foi para a porta da CSN, em Volta Redonda, com um grupo de ativistas e uma carga de peixes deformados pela poluição do rio Paraíba. Os peixes, mortos pelo benzeno, eram para impressionar a mídia e a população da cidade, que, segundo os ambientalistas, estava sendo contaminada pelos resíduos da siderúrgica. Minc também foi um dos mais duros adversários da Petrobras em 2000, quando mais de 1 milhão de litros de óleo da empresa vazaram na Baía de Guanabara. Desde o primeiro dia de 2007, essa imagem de ecoxiita está ficando para trás. Recrutado pelo governador Sérgio Cabral como secretário de Meio Ambiente, Minc continua verde — mas parece ter percebido que essa postura não faz, necessariamente, oposição ao progresso econômico e social.
Em menos de dois meses, o novo secretário produziu fatos que fizeram a alegria não só de grandes companhias e seus projetos bilionários mas também de pequenas e médias empresas, fustigadas pela burocracia dos órgãos ambientais. Nas primeiras duas semanas de mandato, ele organizou um mutirão que deu 111 outorgas de uso de água para projetos como uma fábrica de garrafas da Ambev ou a instalação de pequenas cimenteiras. Foram mais aprovações em 17 dias do que nos últimos dez anos. Uma das primeiras a ter uma boa surpresa foi a ex-inimiga Petrobras. Após reunião com o presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, no início de janeiro, a equipe de Minc produziu em 12 dias a instrução técnica para o licenciamento ambiental do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. Se tudo correr conforme o cronograma, o projeto de 8,3 bilhões de dólares, que vai exigir 50 licenças, será autorizado até outubro — prazo recorde para os parâmetros nacionais. Outra beneficiada foi a Vale do Rio Doce, dona de um terminal no porto de Sepetiba. “Por um ano e meio tentamos autorização para a dragagem do porto, e nada. Perdíamos muito dinheiro, porque os navios maiores não atracavam”, diz Tito Martins, diretor de assuntos corporativos da Vale. “Com o Minc, a licença saiu em 15 dias.”
À espera de licença
Alguns dos grandes investimentos que terão de passar pelo crivo de Carlos Minc, secretário de Meio Ambiente do estado do Rio de Janeiro
Empresa
Complexo petroquímico do Rio de Janeiro
Companhia siderúrgica do Atlântico
Usina de placas da CSN
Arco rodoviário do Rio de Janeiro
Investidor
Petrobras
Thyssen e VALE
CSN
Governo Federal
Valor
8,3 bilhões de dólares
3,4 bilhões de dólares
2,5 bilhões de dólares
400 milhões de dólares
Licenças necessárias
50
8
6
Indefinido
Situação
Em fase inicial de licenciamento ambiental, a empresa ainda não apresentou o projeto da obra
Já recebeu licença de instalação, mas a obra ainda não foi iniciada
Já recebeu licença de instalação, mas a obra ainda não foi iniciada
Ainda não existe projeto executivo para a obra
Fontes: empresas e Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro
A situação dos licenciamentos ambientais no Rio de Janeiro era um caos. Ao assumir a secretaria, Minc encontrou 15 000 processos esperando parecer. Aguardavam na mesma fila desde pedidos de postos de gasolina até projetos gigantescos, tudo registrado apenas em papel. Também faltavam técnicos para fiscalização e veículos para visitas. A primeira medida do governo estadual foi passar para a prefeitura do Rio, por decreto, a responsabilidade por licenças de projetos com impacto municipal. A idéia de Minc é agilizar o processo, já que, pelo menos em tese, maior proximidade entre a prefeitura e o empresariado facilita o diálogo entre as partes. Com a mudança, o estado conseguiu reduzir para 10 000 as pendências. Outra medida pragmática tomada foi aceitar ajuda de empresários. No início de fevereiro, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro doou 27 milhões de reais para equipar, informatizar e reformar o prédio da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente. Com a Petrobras, deverá ser fechado convênio para a contratação de 150 técnicos e professores universitários para avaliar as licenças — e assim agilizar a liberação do projeto de seu complexo petroquímico. A partir de março, a secretaria também vai reduzir de 21 para dez o número de documentos necessários para os pedidos de licenciamento ambiental no estado.
Minc nega que tenha mudado seu comportamento. “Sou midiático, sim, faço manifestação e passeata, mas sempre fui de negociar”, diz ele, que, assim como o deputado federal e amigo Fernando Gabeira, partiu para a luta armada e foi exilado na época da ditadura militar. Segundo Minc, o pragmatismo é fruto da experiência de aprovar seus 128 projetos de deputado transformados em lei. “Aprendi a combinar pancada com negociação”, afirma. “Nenhuma das minhas leis foi aprovada exatamente como eu queria, mas foi melhor que não ter lei nenhuma.” Foi com esse espírito que se aproximou do então candidato à presidência da Assembléia Legislativa do estado Sérgio Cabral, em 1995. “Ele era contra o jetom dos deputados e eu apoiei”, diz Minc. O apoio transformou-se em amizade próxima, a ponto de o secretário considerar-se mais um membro da “cota pessoal” de Cabral do que um representante de seu partido, o PT, no governo. Isso não quer dizer que Minc renegue o PT. Admirador do presidente Lula, ele gosta de relembrar o dia em que, depois de ser elogiado por Cabral numa reunião com a presença de Lula, ouviu do presidente: “Destrava, Minc!” — referência ao papel do secretário na liberação de projetos que possam impulsionar a economia fluminense.
Em tempos de PAC, o pacote de aceleração do crescimento anunciado pelo governo federal, a brincadeira do presidente Lula tem um significado curioso. Ministros importantes de seu governo, como a titular da Casa Civil, Dilma Rousseff, culpam a área ambiental por boa parte dos atrasos em projetos importantes de infra-estrutura. A comparação da gestão de Minc com a da ministra Marina Silva tem sido recorrente, principalmente entre grandes empresas. “No governo federal sempre há novas colocações, novas objeções, tudo concorre para atrasar os projetos. É o inverso do pragmatismo”, diz um executivo de uma grande empresa. A própria ministra, no entanto, nega que haja diferença na maneira de agir. “A atuação de Minc está inteiramente de acordo com o que fazemos aqui o tempo todo, que é negociar sempre com a preocupação de que meio ambiente e desenvolvimento têm de caminhar juntos. Se alguns dizem que somos diferentes, é por desinformação e também porque ninguém vai dizer que quer simplificar ao máximo os processos, mesmo que isso signifique desrespeito ao meio ambiente”, diz Marina Silva, que conhece Minc há pelo menos 20 anos.
O fato é que, se chega a ser comemorada pelo empresariado, a disposição do secretário fluminense já provoca a desconfiança de antigos companheiros do movimento ambiental. “Esse é um pragmatismo perigoso. O complexo petroquímico, por exemplo, vai demandar muito mais água do que a região pode fornecer”, diz Elmo Amador, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e antigo militante pela revitalização da Baía de Guanabara. Minc nega que esteja sendo permissivo e cita como exemplo o caso do projeto de uma usina térmica a carvão planejada pelo grupo Inepar e sócios italianos, também na região de Sepetiba. “Eu disse logo que nem adianta pedir. Não vamos permitir que a região vire uma segunda Cubatão”, diz ele. “Mas também não vou ficar enrolando.”
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Revista Exame