Avanço da China é a preocupação mundial
20/12/06
Rapidamente, desde 2002, a China atingiu o topo mundial em produção e consumo de aço, e nos dez primeiros meses de 2006 viu suas exportações crescerem 92%, o que tornou o país um exportador líquido pela primeira vez em duas décadas. “A China é um “fator de preocupação de todo siderurgista”, diz Marco Pólo de Mello Lopes, vice-presidente executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS). Globalmente, o setor acompanha passo-a-passo os movimentos de Pequim, que, depois de ter expandido em 176% a capacidade de produção de aço entre 2000 e 2005, está em pleno processo de reestruturação de suas usinas. “Hoje, a grande preocupação é como vão se comportar a demanda chinesa e o plano de ajuste siderúrgico”, acrescenta Lopes. Com uma capacidade instalada em torno de 470 milhões de toneladas e exportações que devem ficar em 40 milhões de toneladas neste ano, a China é um grande ponto de interrogação: com a reestruturação do setor o governo de Pequim sinaliza que dará preferência às exportações de produtos com maior valor agregado? Qual será a reação do mercado siderúrgico diante dessa tendência? Se a China se tornar um fornecedor de produtos de maior valor agregado e de outros manufaturados, concorrerá com os integrantes da cadeia sídero-metalúrgica. E não interessa aos fornecedores que a China se torne um elo forte dessa cadeia. Os planos do governo chinês são de contínuo suporte à expansão e modernização da indústria siderúrgica. Projetos em construção ou em estágio de planejamento acrescentarão 150 milhões de toneladas de capacidade, conforme informação apresentada em meados do ano no OECD Steel Workshop, em Nova Déli. Se a China levar adiante esses planos, incluindo a extinção de 55 milhões de toneladas de capacidade em pequenas e velhas usinas, elevará sua capacidade de produção para cerca de 500 milhões de toneladas nos próximos anos. Os chineses têm excedentes em aços longos, utilizados na construção civil, e são exportadores do produto. Já em laminados a frio e galvanizados, a China registra déficit. “O Brasil ainda tem oportunidade de exportar esses dois produtos, mas cada vez menos”, diz Rodrigo Barros, analista de mineração e siderurgia do Unibanco. Dentro de dois a três anos, os chineses serão também auto-suficientes em ambos, prevê.As vendas brasileiras de siderúrgicos para a China vêm diminuindo. De janeiro a outubro deste ano, a participação chinesa nas exportações de produtos planos, em toneladas, caiu para 0,6% em relação a 17,6% no mesmo período de 2005. Em aços longos, a participação chinesa, que era de 3,1% nos dez primeiros meses do ano passado, declinou para 1,4% neste ano, segundo dados do IBS. No total (semi-acabados, planos, longos e outros produtos), a China absorveu 0,5% das vendas externas brasileiras de janeiro a outubro, em comparação com 7,1% em igual período de 2005. Em produtos semimanufaturados de ferro e aço, a queda foi de 69,3% de janeiro a setembro de 2006, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.A avidez com que a China se coloca no mercado mundial de siderúrgicos pode ser notada também no segmento de inox, do qual é o maior consumidor e, a partir deste ano, também o maior produtor, com 28% da produção mundial, à frente do Japão. Há cinco anos, a participação da China na produção de aço inoxidável era de apenas 14%. Até 2008, o país deverá se tornar auto-suficiente e exportará grandes volumes do produto, o que contribuirá para a redução dos preços e acirramento da concorrência no mercado asiático, prevê Peter Kaumanns, diretor de economia e estatística do International Stainless Steel Forum, com sede em Bruxelas. Somente em 2005, US$ 70 bilhões foram investidos no setor na China, sendo que grande parte do investimento vem de outros países, como Estados Unidos, Taiwan e Japão. Os passos do gigante chinês, que representa um terço da produção mundial, vêm sendo observados minuciosamente pelo setor, às voltas com um processo de consolidação e concentração de empresas à semelhança do que ocorreu com a mineração há dez anos. Com baixo custo de produção siderúrgica, o Brasil cada vez mais procurará aliar-se a companhias no exterior, entre outros motivos, para concorrer com a própria China, que está fornecendo para a Europa. Rodrigo Barros projeta um cenário com empresas brasileiras se expandindo na Rússia e Índia, onde há boas jazidas de minério de ferro, para exportar semi-acabados para a Europa. Com isso, diminuirá a vantagem relativa da China na Europa e nos EUA. Na Ásia, as peças do xadrez siderúrgico se movem rapidamente e as grandes companhias não querem ficar fora dele. A Gerdau tem buscado oportunidade de compra de usinas de aços especiais na China. “Quem quer ser grande em siderurgia tem de ter um pé na Ásia”, diz Jorge Gerdau Johannpeter, presidente executivo do grupo. A demanda interna na China, motivada pela produção de utensílios domésticos e automóveis e também por exportações, continuará forte, prevê o Australian Bureau of Agricultural and Resource Economics (Abare). Em relação ao Brasil, a China ainda está em desvantagem, pois seu custo de produção é relativamente superior, uma vez que os fabricantes brasileiros estão perto do minério de ferro, a matéria-prima da qual os chineses dependem e sobre a qual exercem forte pressão na negociação de preços. O apetite da China por minério de ferro se manterá até pelo menos meados da próxima década, antecipa Paulo Camillo Penna, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). Segundo ele, o recente aumento da produção chinesa em nada afeta a competitividade brasileira ou australiana. “O minério chinês pode ser produzido em grande quantidade, mas sua qualidade é baixa, e as siderúrgicas chinesas precisam dos minérios do Brasil e da Austrália, os dois maiores fornecedores, a fim de assegurarem a composição adequada da matéria-prima para seus fornos”, diz Penna. O Brasil exporta aproximadamente 80 milhões de toneladas. A projeção é de um aumento de 10% a 15% em 2007.
Valor Econômico