Aquisição de empresas nacionais movimenta bancas de advocacia
20/07/07
De acordo com uma pesquisa realizada pela PricewaterhouseCoopers, o número de aquisições no Brasil, incluindo controle e participação minoritária, alcançou 249 operações nos primeiros seis meses de 2007, um aumento de 36% em relação ao mesmo período do ano passado. A julgar pela intensa movimentação das áreas societárias dos principais escritórios de advocacia do país, o segundo semestre vai superar de longe o já bom resultado do primeiro. Somente dez entre as maiores bancas de direito empresarial trabalham hoje em mais de 300 novos negócios em andamento – todos aquisições de ativos brasileiros por clientes nacionais ou estrangeiros, sejam eles fundos de investimento ou multinacionais. Desde o início do ano os escritórios vêm recebendo a visita de dezenas de novos clientes que têm em foco ativos de médio e grande porte de vários setores da economia – há negócios nas áreas imobiliária, logística, agroindústria, óleo e gás, energia, serviços, armamento, aviação, portos, rodovias, siderurgia, telecomunicações, petroquímica, metalurgia e mineração. Ainda que o estudo da Price leve em conta apenas as operações tornadas públicas – seja por meio de anúncios ao mercado ou pela imprensa – e o levantamento feito pelo Valor com os maiores escritórios contenha bancas que atuam pelo lado tanto de compradores quanto de vendedores (embora a maioria atue pelos compradores), o número de negociações em andamento dá indícios de que este segundo semestre trará uma série de novas aquisições no país. A movimentação atual já está sendo considerada o maior “boom” da advocacia empresarial no país, superando até mesmo a década “de ouro” das privatizações. Durante os anos 90, os escritórios brasileiros assistiram a um movimento inédito em sua história quando viram entrar pelas suas portas clientes de grande porte, nacionais e estrangeiros, com dinheiro na mão e dispostos a levar para casa uma fatia das estatais em vias de privatização. Desacostumadas a negócios de vulto, essas bancas tiveram que se adaptar rapidamente à nova realidade – advogados se especializaram nos negócios de fusões e aquisições e se associaram para montar equipes mais robustas e dar conta do gigantesco volume de trabalho. Afinal, os fins – o ingresso do setor de serviços jurídicos do Brasil no mundo do direito empresarial de honorários caríssimos – justificavam os meios. Estatais vendidas e milhões em investimentos depois, esses escritórios se viram obrigados a desmontar parte de suas equipes nos anos seguintes, em especial naqueles que sofreram os efeitos do 11 de setembro. Desde então eles aguardavam o dia em que a era da fartura retornasse às suas salas de espera e de reuniões. Agora ela voltou. E o saudosismo da década de 90 foi deixado para trás: os sócios que coordenam as áreas de direito societário dos grandes escritórios de advocacia vêem na movimentação atual uma situação mais sólida e duradoura daquela vivida à época das privatizações – mesmo sabendo que a intensa busca por ativos no Brasil e o volume crescente de negócios decorre do atual momento de grande liquidez do mercado internacional e da capitalização das empresas com os processos de IPOs, cenários de duração incerta. “Estamos vivendo o melhor momento dos últimos anos”, diz Rogério Lessa, sócio, diretor geral e membro do conselho de administração do escritório Demarest & Almeida Advogados, com 85 operações em andamento e nove fechadas desde o início do ano. “O Brasil se inseriu definitivamente no cenário internacional”, afirma Alexandre Bertoldi, sócio e membro do grupo executivo e do comitê diretivo da banca Pinheiro Neto Advogados, com 60 aquisições em processo de formatação e 26 concluídas de janeiro para cá. “Estamos trabalhando muito mais do que na época das privatizações”, conta João Ricardo de Azevedo Ribeiro, sócio da área societária do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados, que contabiliza 40 negócios em estruturação e 20 realizados no primeiro semestre de 2007. De acordo com Rogério Lessa, a boa fase vai novamente descolar o crescimento do setor de serviços jurídicos com o do PIB do país, como ocorreu na década de 90. “Ao contrário da época das privatizações, agora os negócios que estão surgindo derivam da estabilização da economia e da maior credibilidade no país”, diz. No espectro de novos investidores estão desde multinacionais que investem no setor em que atuam até fundos de investimento dispostos a adquirir ativos ainda baratos no país, apostando na proximidade de o risco de crédito do Brasil ser classificado como “investment grade”. A euforia é tanta que os advogados comemoram, perplexos, a chegada de clientes até então desconhecidos – como uma empresa grega que aportou no Demarest para negociar a compra de uma mineradora ou uma indiana interessada na área de medicamentos genéricos. O entusiasmo não decorre só do ineditismo dos negócios, mas dos valores envolvidos. “Não temos nenhuma operação abaixo de R$ 100 milhões em andamento”, diz Rubens Serra, sócio do escritório Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, com 22 operações em estruturação no momento e outras 20 concluídas no primeiro semestre deste ano. “E estamos só no início da avalanche de investimentos que vai acontecer, principalmente pela capitalização das empresas com os IPOs”, afirma. Segundo Bruno Camara Soter, sócio diretor do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão Advogados, que já concluiu sete aquisições neste ano e atua em outras dez no momento, a grande maioria das operações supera os US$ 100 milhões – valor de negócios considerados de tamanho razoável. A pulverização do alvo dos investidores em diversos setores favorece o grande número de negócios – outra característica do atual momento que diverge da época das privatizações. “Ainda há setores mais ativos do que outros, mas é um movimento geral”, diz José Luís de Salles Freire, sócio do escritório TozziniFreire Advogados, com 17 operações em andamento e 30 concluídas ao longo deste ano. Alexandre Bertoldi, do Pinheiro Neto, aponta algumas conseqüências do atual momento que devem surgir: a redução da informalidade, uma maior profissionalização e um aumento da concentração dos diversos setores da economia nas mãos de um número menor de empresas. “Este pico do setor de fusões e aquisições deve mudar o perfil empresarial brasileiro”, afirma Luis Antonio Semeghini de Souza, sócio da área de mercado de capitais do escritório Souza, Cescon Avedissian, Barrieu e Flesch Advogados, que assessora 30 negócios em vias de concretização. E não são somente os escritórios de grande porte que estão aproveitando o novo “boom” do mercado de serviços jurídicos no país. A mesma pulverização dos investimentos em diversos setores acaba propiciando também a participação de bancas de pequeno porte especializadas. O Grebler Advogados, com sede em Belo Horizonte e filial em São Paulo, aproveita o bom momento participando de cinco projetos de aquisições no setor de mineração – uma das suas principais áreas de atuação – e de outros na área de energia. “Se metade dos negócios for concretizada a filial paulista deve crescer 50% neste ano”, diz o sócio Leonardo Grebler. Com 15 advogados – apenas cinco na área de societário -, o Tess Advogados atua hoje em quatro projetos de aquisições, todos de estrangeiros comprando ativos no Brasil. O sócio Eduardo Tess esteve recentemente em um encontro da rede de escritórios Interlaw e relata o caso de bancas de outros países associadas com clientes interessados em investir no Brasil. “A insegurança jurídica, um dos temas de discussão do encontro, melhorou muito nos últimos anos”, diz. A aposta unânime dos advogados é a de que o ano – que segundo alguns deles “começou bem antes do Carnaval” – seja apenas o início do ciclo de investimentos no país. De acordo com Robson Barreto, sócio e coordenador da área societário do escritório Veirano Advogados, que atua em 15 operações de aquisição no momento, o crescimento deste tipo de negócios é a terceira perna da equação que começou com a onda de IPOs que, em um segundo momento, gerou empresas capitalizadas, dispostas a ir às compras. “O `investment grade` será o momento do auge”, diz. Para Carlos José Rolim de Mello, sócio da área societária do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, que atua em cerca de 20 operações de aquisição em andamento e já concluiu 15 desde o início do ano, a ida das empresas brasileiras ao mercado de capitais inibe as operações deste tipo – já que, entre a venda e o IPO, muitas fizeram a segunda opção em busca de capitalização. “Mas a tendência é que esses IPOs tenham um reflexo muito grande nas aquisições daqui para a frente, pela necessidade de investimento do capital”, afirma. “Quem pensa que hoje a movimentação está grande tem que se preparar para o que vem adiante: o `boom` virá daqui para a frente.”
Valor Econômico