Vale negocia dívida com municípios
02/04/07
BELO HORIZONTE, 2 de abril de 2007 – A Companhia Vale do Rio Doce deu o primeiro passo para negociar sua dívida, estimada em R$ 2 bilhões, com grande parte dos 21 municípios mineradores de Minas, ao se reunir com os prefeitos dessas localidades para contestar parte dos valores, calculados pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). A reunião foi na sede da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais (Amig) e os dois representantes da mineradora informaram, segundo os presentes, que a empresa pretende quitar rapidamente a parte do débitos sobre a qual não haja contestação.
Essa enorme dívida decorre dos 14 anos em que o DNPM praticamente não fiscalizou as mineradoras por falta de técnicos para realizar esse trabalho no estado. Segundo o presidente da Amig, Waldir Salvador de Oliveira Júnior, que é prefeito da cidade de Itabirito, a fiscalização foi retomada por uma força-tarefa. Antes, havia um único fiscal para acompanhar a produção e as vendas de 500 empresas de variados tipos de mineração registradas num estado que é maior que a França.
“O resultado da reunião foi excelente pois marcou o início de um diálogo, já que não queremos conflitos com as empresas”, declarou. Outra causa da formação da dívida, segundo explicou, é a confusa fórmula de cálculo da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais(CFEM) que é o royalty pago aos municípios, estado e governo federal pelo direito de explorar as riquezas da região. Ela é calculada sobre o valor do faturamento líquido obtido na venda do produto mineral e as alíquotas variam de 0,2% a3% de acordo com o tipo de minério de ferro a ser explorado.
Do total arrecadado, 65% são destinados aos municípios mineradores, 23% ao estado e 12% à união. A causa do conflito entre mineradoras e o poder público consiste exatamente na conceituação do valor líquido, pois a lei dizia de forma genérica que o percentual é calculado a partir do total de vendas no mês, deduzidos os tributos que incidem na comercialização e os custos com produção, transporte e seguro. Algumas mineradoras incluem numerosas despesas no quesito custo do produto, até um suposto frete no transporte do minério da mina aos britadores e as despesas com a manutenção de escritórios no exterior, como Londres e Tóquio.
Nesse longo período sem fiscalização houve enormes mudanças na atividade mineral em Minas. A Vale foi privatizada e adquiriu quase todas as mineradoras existentes no estado, como a Ferteco, MBR e Samarco, tornando-se portanto responsável por 92% do débito, um total de R$ 2,2 bilhão. Os outros 8% restantes correm por conta da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que detém os direitos de exploração do minério da jazida de Casa de Pedra apenas na parte destinada ao consumo próprio. O restante, por força de contrato entre as duas partes, também é exportado pela Vale.
Crescimento
Também a produção experimentou um gigantesco aumento e hoje é superior a 200 milhões de toneladas por ano. A despeito desse extraordinário acréscimo, os preços também cresceram, por conta das importações chinesas. O preço da tonelada de minério de ferro já é superior a US$ 40 dólares por tonelada e o de pelotas de minério está em torno de US$ 85. Há um ano, com o objetivo de atender às crescentes demandas de importadores, a Vale inaugurou a mina de Brucutu, construída no curto período de 24 meses e produz 30 milhões de toneladas por ano. É a maior mina do mundo a céu aberto, em início de atividades.
Na reunião em Belo Horizonte, na última sexta feira, a Vale foi representada por José Ribamar Chehehe, dos setor de Relações Institucionais e pelo tributarista Crispim Nésio. Segundo vários prefeitos presentes, o objetivo da companhia foi o de iniciar um diálogo referente ao débito, que será anunciado oficialmente pelo DNPM dentro de duas semanas. O valor foi antecipado em reunião em Brasília, em 14 de março, entre dirigentes do órgão federal com os prefeitos das cidades mineradoras.
Na ocasião, os prefeitos foram informados de que o pedido de reavaliação do cálculo, solicitado pela Vale foi compostos por 16 questionamentos, dos quais apenas dois foram acatados. Um se refere à critérios para conversão das várias moedas existentes naquele período de 14 anos (cruzeiro, cruzado, URV, entre outras). O outro tinha como base o abatimento do PIS e Cofins.
As dívidas das empresas mineradoras variam de acordo com o volume de minério produzido. Os maiores credores são Mariana e Ouro Preto, com cerca de R$ 400 milhões, cada. O prefeito deste último município, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos, saiu da reunião convencido de que a empresa mineradora irá quitar imediatamente a parte do débito sobre o qual não caiba contestação judicial. Abordados por este jornal, ao final do encontro, que teve a duração de 90 minutos, nenhum dos representantes da Vale fez qualquer declaração.
Em recente entrevista a este jornal, o presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Paulo Camilo criticou a divulgação pela Amig de valores antes da conclusão do processo pelo DNPM. “A Amig tem feito uma pressão política para atropelar a questão, que é meramente técnica, de modo a tentar arrancar uma decisão açodada do órgão federal”, disse Camilo. “Isso cria uma expectativa muito grande”, afirmou. (Durval Guimarães – Colaborou Téo Scalioni – Gazeta Mercantil)
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