Vale: infundado ou não, reajuste no minério de ferro reforça otimismo de analistas
05/09/08
SÃO PAULO – Um dos eventos de maior peso no calendário das grandes mineradoras e siderúrgicas do mundo, a celebração de contratos de reajuste de preços do minério de ferro toma lugar, tradicionalmente, entre o final de um ano e o começo de outro. Não é de se estranhar, portanto, os rumores surgidos na tarde da última quarta-feira (3).
Os mais desatentos ao noticiário dos mercados viram, por volta das 11h00 do último pregão, as ações preferenciais da Vale (VALE5) atingirem alta de mais de 4%, enquanto que, paralelamente, as principais commodities metálicas seguiam em trajetória negativa. A razão para tal aparente contradição veio à tona com a notícia de que a mineradora teria conseguido um reajuste adicional no preço do minério.
Segundo informações da Steel Business Briefing – agência estrangeira especializada no setor de siderurgia e mineração – a companhia brasileira teria celebrado junto às siderúrgicas chinesas um reajuste extra de cerca de 20% frente ao patamar acordado em fevereiro desse ano, deixando o produto de 86% a 92% mais caro do que em 2007, variação esta que se dá de acordo com a região na qual é extraído.
Indagada pela InfoMoney, a Vale afirmou “ainda não possuir informação oficial a respeito”. Pouco depois, a empresa comunicou em nota enviada ao mercado que “desconhecia tais rumores”. Todavia, as especulações se mantêm fortes nos mercados e a postura da Vale somente alimenta maiores rumores: nesta quinta-feira, há os que afirmam reconhecer um reajuste de 13%, ao passo que outras fontes confirmam o valor de 20%.
Os céticos
Desta forma, embora o tema seja complexo e sujeito a considerações relevantes com panos de fundo diversos, à primeira vista, os analistas dividem-se entre dois grandes grupos: os que, de fato, julgam provável tal reajuste e os mais céticos, que desconfiam de tal evento extraordinário no calendário da mineração e siderurgia global.
Entre o último grupo, que parece ser ligeiramente mais expressivo, estão os analistas do Banif, para quem “a possibilidade de usinas siderúrgicas aceitarem aumentos de preços neste período é bem remota, por causa do aumento de estoques de minério de ferro nos principais portos da China continental”. O Citi compartilha de visão semelhante: “o timing de tal acordo seria estranho, uma vez que o preço do aço chinês vem caindo”.
No mesmo sentido, a equipe da Ativa Corretora recebe com `um pé atrás` um possível fim da estrutura de preços anuais de referência para o minério de ferro. Segundo os analistas, tal reajuste aplicado a essa altura do jogo feriria a vigência contratual dos atuais preços, negociados no início do ano, em uma decisão unilateral que dificilmente seria aceita pelos chineses.
Entretanto, cabe uma ressalva, feita pelos analistas do Bradesco. Sob a empreitada de colher maiores informações, a equipe do banco buscou uma declaração da Vale de que os rumores não poderiam ser confirmados devido a cláusulas contratuais que exigem confidencialidade dos termos. Desta forma, o “desconhecimento” da Vale quanto aos rumores seria puro impeditivo legal ou, de fato, não há qualquer reajuste celebrado?
Concorrência australiana
Tal pergunta deve pairar sobre o ar das praças financeiras por algum tempo. Nesse sentido, conjeturar sobre a validade dos rumores pode se revelar uma tarefa inócua. Entretanto, como bem avaliam os analistas, o surgimento das especulações vem em momento oportuno para se avaliar o cenário do setor de mineração e siderurgia no mundo e, ao mesmo tempo, traçar projeções para a próxima temporada de reajustes no preço do minério de ferro, cujas negociações devem começar já no último trimestre desse ano.
Um ponto é consensual entre as equipes de análise no mercado: a concorrência frente às grandes mineradoras australianas. Para a Ativa, ainda que o minério australiano tenha a vantagem de incorrer menores custos às siderúrgicas chinesas, dado a maior proximidade geográfica, o produto brasileiro é de melhor qualidade, e, portanto, não deveria ter recebido um reajuste menor no começo do ano.
Desta forma, em leitura similar à da Ativa, os analistas da Ágora Corretora flertam com a sólida possibilidade de um reajuste, sim, de 20% no preço do minério de ferro, mas nos primeiros meses de 2009, em linha com o calendário das negociações. “A demanda global por minério de ferro continua aquecida”, afirma a equipe, justificando suas projeções.
Capex e mercado spot
Além da evidente comparação com os preços praticados pela BHP Billiton e pela Rio Tinto, outros elementos são avistados pelos analistas como indícios positivos de um expressivo reajuste a ser celebrado nos preços do minério de ferro em 2009. O Citi destaca, entre outros fatores, a maior necessidade de captação da Vale a fim de sustentar a ampliação dos investimentos previstos em seu capex.
Há ainda a questão do mercado spot, segmento em que a Vale vem elevando sua atuação na China e que, de acordo com a visão do Citi, estaria sendo usado como “ferramenta de pressão” sobre as siderúrgicas. Todavia, qualquer cautela é pouca em um contexto de fortes incertezas quanto ao rumo da economia mundial e chinesa, já que esta, ainda que siga com crescimento robusto, começa a dar sinais de desaceleração.
Os analistas do Credit Suisse seguem nesta linha ao recomendarem cautela aos investidores interessados no setor, expressando uma visão de “maiores turbulências e continuidade de um confuso noticiário por vir”, tendo em vista o recente arrefecimento no consumo de aço, acompanhado por menores taxas de produção entre as grandes siderúrgicas chinesas.
Efeito sobre papéis
Tantas considerações explicitam a complexidade do setor global de mineração e siderurgia. Portanto, o investidor tem muito a que atentar nos próximos meses, mas a tarefa deve valer a pena. Ao menos é o que dizem as projeções traçadas pelos analistas aos papéis da Vale, que recebem recomendações consensualmente positivas, seja de “compra” ou “outperform” – acima da média do mercado.
Os analistas do Bradesco estão entre os que compartilham de tais expectativas favoráveis. Já otimista antes, a equipe traçou cálculos de sensibilidade para avaliar o impacto de tal reajuste de 20% no preço do minério de ferro sobre o preço-alvo dos papéis da Vale. E os números auferidos animam: uma elevação de R$ 5,00 no preço-alvo das ações ordinárias, ao passo que a projeção das preferenciais teria que ser acrescida em R$ 4,50.
Yahoo Notícias