Uma corrida de obstáculos
18/08/08
Gustavo Paul e Eliane Oliveira BRASÍLIA
Após o fracasso da Rodada de Doha, que eliminou a possibilidade de amenizar os projetos de barreira comercial já em curso, os exportadores brasileiros terão, daqui para frente, que vencer uma corrida de obstáculos para se manterem no mercado da União Européia (UE). Em bloco, é o maior comprador de produtos do Brasil. A partir de dezembro, entram em vigor as normas ambientais impostas pelo Reach (sigla em inglês para Registro, Avaliação e Autorização de Substâncias Químicas), que na prática representam uma poderosa barreira não-tarifária a produtos de todo o mundo ao mercado local.No caso brasileiro, estão em jogo cerca de US$ 9 bilhões por ano em exportações, distribuídos em US$ 2,5 bilhões em produtos químicos vendidos anualmente ao mercado europeu, mais os produtos industrializados que levam essas substâncias.O tempo está se esgotando, pois a partir de 1ode dezembro vence o prazo para as empresas fazerem um pré-registro de cerca de 30 mil substâncias químicas junto à Agência Européia de Produtos Químicos, em Helsinque. Os europeus argumentam que não se trata de uma barreira não-tarifária, pois as medidas também serão aplicadas a produtos fabricados no bloco.O Reach é um monstro burocrático de mil páginas, inédito no mundo.Com ele, o bloco europeu busca melhorar a segurança dos produtos químicos fabricados ou importados para proteger a saúde e o meio ambiente.Serão atingidos do etanol ao minério de ferro, de brinquedos a automóveis, de solventes a confecções.
Medidas valem a partir de 2009
As novas regras impõem aos industriais, e não mais às autoridades públicas européias, a responsabilidade de avaliação dos riscos toxicológicos decorrentes do uso de seus produtos. Além disso, torna obrigatória a contratação de representantes na Europa das empresas brasileiras.Cada substância química exportada ou produto que tenha substâncias químicas em sua composição e cuja quantidade seja superior a uma tonelada deverá passar pelo pré-registro.A partir de 2009, elas terão de passar por um rigoroso processo de registro, o que deve consumir entre C 20 mil e C 70 mil por produto. Esse procedimento se estenderá até 2018.? A medida vale para minério e para bens de consumo diário. Um importador de sapatos que tem cola e verniz na composição de seu produto que exportar mais de uma tonelada do produto para a Europa terá de préregistrar e depois registrar seu produto ? explica Paulo Camillo Penna, presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).A mineração é um dos setores que mais serão afetados pela medida, pois ligas metálicas como ouro, nióbio, cobre e níquel passam por processos químicos. Essa etapa, que pode ser feita pela internet de forma gratuita, permite que o empresário tenha mais prazo para a etapa de registro. As empresas que indicarem as mesmas substâncias nessa fase também poderão formar consórcios para dividir os custos do laboratório para realização dos testes.Preocupados com as conseqüências desse processo, governo e empresários estão se mobilizando. A percepção é que a novidade ainda não é conhecida pela maioria dos exportadores. Na próxima quartafeira, na sede da Fiesp, entidades empresariais, incluindo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), Abiquim e Ibram, vão se reunir para discutir o tema. Na sexta-feira haverá uma palestra sobre a nova legislação para empresários no Ministério do Desenvolvimento, em Brasília.
Governo dará apoio logístico a empresas
A CNI divulgou nota na sexta-feira passada alertando os empresários.?O desempenho da balança comercial brasileira poderá ser afetado a partir de 2009, caso as empresas que exportam para a União Européia não pré-registrarem as substâncias químicas presentes em seus produtos?.Segundo o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, o governo estuda dar apoio logístico para as empresas em Helsinque. Para isso, vai se articular com outros órgãos federais voltados às exportações. Nos próximos meses também devem aumentar as atividades oficiais de mobilização empresarial.Para Barral, como as medidas valem para todos os produtos mundiais, inclusive os europeus, não podem ser questionadas, até que se constate algum tipo de discriminação contra produtos brasileiros. Isso só seria possível durante o processo, e não antes. Ele alerta que as empresas terão de se adaptar, pois trata-se de um processo irreversível e que poderá levar outros blocos econômicos a adotar medidas semelhantes.? Qualquer país, desde que tenha fundamento científico, pode fazer exigências desse tipo. Mas se exigências não tiverem fundamento podese entrar com uma reclamação na Organização Mundial do Comércio ? disse Barral.
POUCAS EMPRESAS BRASILEIRAS BUSCAM SE ADAPTAR ÀS NORMAS, na página 38
O Globo