Panorma Econômico
25/05/07
Panorama EconômicoImbróglio cearense O governo está com um abacaxi para resolver no Ceará. A polêmica se chama Ceará Steel, uma siderúrgica de capital coreano e italiano. De um lado, está o lobby do aço, com o Instituto Brasileiro de Siderurgia, que reclama do subsídio que seria dado ao gás, e a Petrobras. Do outro, estão os políticos cearenses, que se apóiam numa promessa de campanha do presidente Lula. Mas esta batalha envolve ainda outras questões.O projeto da Ceará Steel não é de agora. A idéia de se fazer uma siderúrgica no estado para fomentar a economia local, com fornecimento de gás mais barato, vem do governo Fernando Henrique.Mas o presidente Lula encampou o projeto e o defendeu em várias ocasiões.A fábrica custará US$ 750 milhões. Como sócio minoritário, com 7%, está a Vale do Rio Doce que, não é de hoje, vem estimulando o aumento do número de siderúrgicas no país para poder vender, aqui dentro mesmo, uma parcela maior da sua produção de minério. A tecnologia utilizada nesta siderúrgica exige gás não apenas para aquecer as caldeiras, mas também como matéria-prima, o que aumenta muito a demanda. No Brasil, na enorme maioria dos casos, o gás não é usado para esse fim; e, sim, o carvão mineral e o vegetal.Com uma grande necessidade de gás, o x da questão que envolve a Ceará Steel está exatamente nas discussões quanto ao fornecimento do insumo. Os sócios afirmam que a siderúrgica só é viável no Ceará se houver o subsídio, com o gás alcançando, no máximo, US$ 3,20 por milhão de BTU (hoje ele está em US$ 5,8 por milhão de BTU, e aumentando).O gás mais barato foi negociado e aceito pela própria Petrobras há alguns anos.Como, na época, a oferta era bem maior e, portanto, o preço bem menor, achou-se viável o fornecimento. No ano passado, o próprio presidente da companhia, Sérgio Gabrielli, assinou um documento em que garantia o fornecimento de gás, porém nele não constava a questão do preço. Atualmente, com o gás escasso e com o preço com chances de subir bastante, a Petrobras recuou e anteontem, em Brasília, Gabrielli deixou os políticos cearenses irritados ao declarar, com todas as letras, que “o empreendimento é economicamente inviável e que não interessa à Petrobras da forma que está”.A senadora Patrícia Saboya (PSB-CE) argumenta que vai ser necessário algum esforço para levar mais desenvolvimento ao Nordeste, apoiada nas declarações do próprio presidente Lula. Ela diz que já foram investidos R$ 200 milhões pelo estado para garantir a siderúrgica que pode trazer 10 mil empregos diretos e indiretos e aumentar em 5% o PIB do Ceará.? Agora é uma decisão política. A questão tem que ser resolvida pelo presidente ? afirma.Já o IBS lista uma série de razões para ser contra o gás subsidiado. Algumas delas: isso poderia trazer de volta acusações já enfrentadas superadas de concorrência desleal no mercado internacional; uma única empresa teria insumo mais barato; o fato de a coreana Dongkuk já ser cliente brasileira; e tecnologia usada.? O uso do gás como redutor só é feito em países em que há muito gás, como o caso de Venezuela, Rússia, Arábia Saudita ? argumenta Marco Polo de Mello, do IBS.Não há como negar que fornecer um insumo escasso, ainda mais subsidiado, não parece ser nada razoável.O professor Roberto Schaeffer, da Coppe/UFRJ, traz um novo argumento: o perigo de o Brasil estar abusando das indústrias que usam a energia de forma intensiva, como siderúrgicas ou fábricas de celulose. Segundo ele, muitos países transferem sua produção para áreas em que a energia mais barata e a “importam” através dos produtos. Neste caso, diz ele, acabaríamos exportando energia, que anda escassa por aqui, e, ainda por cima, subsidiada.A Ceará Steel é briga de cachorro grande. O presidente Lula é que deverá decidir.Mas uma coisa é certa: a Petrobras não pode ser usada toda hora como cartão de crédito do governo.Energia estatizada Não é apenas na Bolívia e na Venezuela ? ambas com governos nacionalistas mais barulhentos ? que está aumentando a presença do Estado no setor de energia. Em vários países, cresce o government take, ou seja, a parte do recurso gerado na atividade de exploração de petróleo e gás, como royalties, impostos, que fica com o governo. Estes números abaixo, compilados pela Cambridge Energy Research Associates (Cera), ilustram bem o que houve em alguns países latino-americanos. O maior problema, explica a Cera, não é a proporção ser alta, mas, sim, a variação forte, como nestes três exemplos. Essa instabilidade acaba inibindo, em parte, os investimentos.O Brasil, por enquanto, está melhor na fita, assim como Colômbia e Peru.
O Globo