Oferta da BHP pela Rio Tinto é mais recente vítima da crise econômica
26/11/08
A BHP Billiton retirou subitamente a sua oferta para comprar a mineradora concorrente Rio Tinto, após 18 meses de insistência, sob o argumento de que a queda recente nas commodities e a crise econômica mundial tornaram a proposta de US$ 68 bilhões arriscada demais para ser completada.
Apesar de a BHP ter informado que ainda pode tentar comprar outras mineradoras enfraquecidas pela crise econômica, o colapso do acordo de troca de ações, cujo valor chegou a mais de US$ 170 bilhões num determinado momento, pode ser o último prego no caixão do boom de fusões e aquisições grandiosas de 2004 a 2007. A ação da Rio Tinto caiu 37% depois do comunicado, enquanto as da BHP subiram 7%, indicando o alívio dos investidores preocupados com o potencial endividamento da empresa.
A proposta teria unido a maior mineradora do mundo em produção à terceira colocada, e criado um titã internacional com operações da Austrália ao Alasca e ativos em cobre, alumínio, ferro e outras matérias-primas vitais. A fusão também teria deixado nas mãos de apenas duas empresas – a BHP-Rio Tinto e a Companhia Vale do Rio Doce -, 70% ou mais do minério de ferro que cruza os oceanos, o que daria a elas uma vantagem extraordinária sobre os compradores, especialmente as siderúrgicas, que protestaram contra a possível fusão desde o início.
A BHP informou ter abandonado a oferta porque temia se endividar demais se o acordo fosse fechado, ainda mais porque a atual crise econômica dificultaria a venda de ativos para o pagamento de dívidas.
“A decisão tem como cenário a crise econômica mundial e seu impacto na nossa avaliação dos benefícios”, disse ontem o diretor-presidente da BHP, Marius Klopper, em Melbourne, Austrália. “Acho que os preços das commodities em nossa carteira de ativos e para a maioria dos outros envolvidos no setor já caíram mais de 50% nas últimas seis semanas. Claramente, isso teve um impacto no nosso fluxo de caixa.”
O cenário econômico está bem diferente de quando a BHP anunciou sua oferta de três ações para cada ação da Rio Tinto, em novembro de 2007. Na época, a cotação do minério de ferro, cobre, carvão e outras commodities estava subindo rapidamente, em boa parte graças à rápida industrialização da China.
A Rio Tinto considerou que a oferta subvalorizava a empresa, forçando a BHP a aumentá-la para 3,4 ações, algo que contribuiu para que o acordo fracassasse, disseram banqueiros. Para evitar a diluição do capital, a BHP planejava recomprar US$ 30 bilhões de suas ações. Isso, juntamente com os US$ 40 bilhões em dívidas da Rio Tinto, assim como suas próprias, aumentaria o endividamento da BHP para quase US$ 80 bilhões na mesma época em que a queda na demanda e no preço das commodities poderia corroer sua capacidade de pagá-las.
De fato, em meados de 2008, a desaceleração já era evidente na China e, em setembro, a demanda por metais e minerais teve uma queda acentuada.
Há apenas duas semanas, a BHP continuava defendendo o acordo, afirmando que fazia ainda mais sentido numa economia enfraquecida, porque as sinergias poderiam fornecer uma economia de custos importante.
Essa visão aparentemente começou a mudar quando a BHP entrou na fase final e mais difícil da fusão – obter a aprovação da Comissão Européia. O prazo final da BHP para propor quais ativos poderiam ser vendidos era segunda-feira que vem – o que deveria acalmar as preocupações com monopólio explicitadas pela União Européia no início do mês.
Mas com o aperto mundial de crédito e o declínio das commodities, vender ativos como esses não renderia tanto quanto a BHP previa alguns meses atrás.
O fracasso do negócio não repercute bem para os presidentes executivos das duas empresas. A ousada oferta foi anunciada poucas semanas antes de Kloppers assumir o comando e desde então dominou sua atenção. Durante o último ano, Kloppers descreveu o acordo como bom para todos. O diretor-presidente da Rio Tinto, Tom Albanese, contudo, ainda resistia, dizendo que a oferta subvalorizava a empresa. Diante da queda brusca das commodities, a oferta agora parece bem generosa.
A Rio Tinto informou que continuará “com sua estratégia de operar e desenvolver ativos de larga escala e longo prazo, com custo baixo, para gerar rendimento significativo para os acionistas”.
O colapso do que poderia ter sido a segunda maior aquisição hostil da história cria uma longa lista de prejudicados e beneficiados em todo o setor. Entre os beneficiados estão as siderúrgicas mundiais e sua insistência de que a fusão entre a BHP e a Rio Tinto asfixiaria a livre concorrência no mercado para insumos do aço.
Entre os prejudicados estão a Alcoa Inc. e, em menor grau, a produtora estatal de alumínio Chinalco. As duas tinham se unido para comprar uma fatia de US$ 14,5 bilhões na Rio Tinto. Embora o investimento da Chinalco já tenha perdido US$ 10 bilhões no papel, o benefício para a China em manter separadas as duas maiores fornecedores de minério de ferro para as siderúrgicas vale muito mais do que isso, disse um banqueiro que participou do acordo.
A Alcoa pode não ter essa sorte. O US$ 1 bilhão que investiu na Rio Tinto agora vale cerca de US$ 250 milhões. O acordo fracassado ainda por cima elimina suas esperanças de que estaria bem posicionada para comprar a ex-concorrente Alcan, hoje parte da Rio Tinto e que a BHP provavelmente teria de vender depois da fusão.
Valor Econômico