Mineradoras preferem o Canadá
18/03/11
Pelo menos 15 empresas que exploram produtos como ouro e potássio no Brasil abriram o capital nas principais bolsas canadenses nos últimos anos.
O setor de mineração brasileiro expõe uma curiosa contradição. Apesar de o Brasil ser reconhecido no mundo como uma das maiores potências minerais, com reservas comprovadas de 42,5 bilhões de toneladas – equivalente a 10% das reservas mundiais – o setor tem poucas companhias com ações negociadas na bolsa brasileira. Das 376 empresas com papéis cotados na BM&FBovespa, apenas meia dúzia é do setor, como Vale e MMX.
Não que falte interesse das mineradoras. Pelo menos 15 empresas donas de ativos no Brasil, ou que atualmente fazem sondagens de exploração de produtos como ouro, minério de ferro, potássio e fosfato no território nacional, estão registradas em bolsa – no Canadá.
Em geral, são companhias formadas por empreendedores brasileiros, detentores de direitos de lavra (que têm a prerrogativa de fazer a exploração), associados a fundos de investimentos e empresas estrangeiros.
Segundo estimativas do banco WestLB, cerca de US$ 2 bilhões foram captados por empresas do setor de mineração com ativos no Brasil nos últimos 10 anos em bolsas de valores fora do país.
Desse volume, 80% foram levantados em operações de oferta pública inicial e emissões posteriores de ações, sobretudo de empresas em fase pré-operacional, nas duas principais bolsas do Canadá, a Toronto Stock Exchange (TSX) e a Toronto Stock Venture Exchange (TSXV). A TSXV equivale ao mercado de acesso brasileiro, o Bovespa Mais.
“A grande parte desse valor foi destinada a projetos de ouro. Mas existem agora boas perspectiva nos setores de metais básicos, como cobre, minério de ferro e fertilizantes [fosfato e potássio] com grandes projetos em fase de viabilidade”, diz Claudio Pitchon, vice-presidente responsável pelo setores de commodities, metais e mineração do WestLB.
A promessa iminente de abertura de capital no Canadá, entre abril e maio, é a Rio Verde, que explora potássio e fosfato, matérias primas usadas na fabricação de fertilizantes para aplicação em agricultura.
A empresa foi criada no fim de 2010, quando dois investidores estrangeiros juntaram seus ativos a outros empreendedores brasileiros, donos de projetos nos estados do Pará, Piauí, Ceará e Sergipe. Agora, espera captar entre US$ 30 bilhões e US$ 40 bilhões na oferta pública.
“O mercado de fertilizantes é um dos setores de maior potencial de expansão, em razão da perspectiva de aumento de consumo e da falta de alimentos no mundo. E fertilizantes são a base da produção de alimentos”, diz o executivo Julio Carvalho, membro do conselho de administração da Rio Verde e um dos investidores da empresa.
Julio Carvalho é, aliás, presidente da Rio Novo, mineradora que tem jazidas de ouro em Tocantins e Mato Grosso, a mais recente oferta pública de uma empresa com ativos no Brasil feita no Canadá. Baseada no Caribe, a Rio Novo foi fundada em 2008, tem investidores brasileiros e abriu o capital em março de 2010.
O maior destaque da bolsa canadense no grupo de empresas formadas por ativos brasileiros é a Yamana. A empresa surgiu como um projeto de sondagens de ouro e cobre em Goiás, que comprou pequenas minas da Vale que estavam em exaustão. Abriu o capital em fevereiro de 2005 e atualmente tem valor de mercado de US$ 9 bilhões.
Historicamente, o Canadá é um dos países mais tradicionais na exploração de minérios. Nas bolsas canadenses, 1.531 das 3.600 empresas negociadas são mineradoras.
O Canadá lidera a captação de recursos para as empresas do setor. Dos US$ 29,6 bilhões captados pelas mineradoras em bolsa em todo o mundo em 2010, 60% (US$ 17,8 bilhões) foram levantados nas bolsas de Toronto.
O mercado de acesso é extremamente vigoroso. Das 1.531 empresas listadas nas duas principais bolsas canadenses em 2010, 1.178 estavam na TSXV. Essas companhias captaram US$ 5,3 bilhões, o que representa cerca de 30% dos US$ 17,8 bilhões.
O que está por trás da dificuldade do Brasil seguir o exemplo do Canadá é uma série de entraves, que envolve falta de padronização para medir reservas minerais, desconhecimento das especificidades do setor por parte das bancas de escritórios, estruturadores de operações e, ainda, aversão dos investidores aos riscos associados à exploração de minérios.
Primeiro, o setor é considerado alto risco. As empresas investem pesado em pesquisas de sondagens e projetos de viabilidade de exploração das minas num período de aproximadamente quatro anos até começar a produzir efetivamente.
Estima-se que apenas um em cada 100 projetos de mineração entra em operação.
Outro importante entrave é a falta de padronização na especificação do tamanho de reservas minerais que possa dar garantias para os investidores.
“Além do Canadá, países como Austrália criaram códigos que definem, entre outros critérios, número e profundidades das perfurações e uma regulamentação que determina a aferição do tamanho da reserva por um profissional qualificado”, diz o executivo Roberto Busato Belger, vice-presidente sênior da Mbac, que explora fosfato e potássio em quatro Estados brasileiros, e também abriu o capital no Canadá, em dezembro de 2009.
A Mbac é a quarta maior empresa exploradora de potássio em operação no país, atrás apenas de Vale, Coperbrás (Anglo) e Galvani.
O que pode mudar o papel do Brasil no cenário mundial é a aprovação do marco regulatório do setor, que está para ser encaminhado ao Congresso Nacional para votação. O texto elaborado prevê três principais discussões: a criação de uma agência reguladora, determinação de prazo para o direito de lavra e definição de novos valores para cobrança de royalties.
Valor Ecnômico