Governo faz projeto que libera mineração em terras indígenas
01/06/07
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
As mineradoras que quiserem explorar reservas em áreas indígenas terão que pagar royalties para os índios. O valor arrecadado será dividido: metade irá diretamente para a comunidade que vive próxima à mina e metade para um fundo administrado pela Funai (Fundação Nacional do Índio).
O valor não está definido, mas deverá ser de, no mínimo, 3% do faturamento com a extração do minério.
O repasse dos recursos para os índios faz parte do projeto de lei que o governo pretende enviar ao Congresso permitindo e regulamentando a exploração mineral em área indígena, atividade hoje proibida. Uma minuta de projeto deverá ser apresentada no início da semana que vem à Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), órgão consultivo do governo federal.
De acordo com Luiz Fernando Villares e Silva, procurador-geral da Funai, depois que a CNPI analisar o projeto, fará sugestões. Essas sugestões serão analisadas pelo governo, que também vai ouvir outras partes interessadas, como mineradoras. Depois de avaliar as sugestões, o governo irá enviar um projeto de lei ao Congresso.AlternativasSegundo Villares e Silva, além do recebimento dos royalties, o projeto assegura ainda outras alternativas de participação dos índios na atividade de mineração: exploração direta (extrativismo mineral indígena), associação com uma empresa de mineração ou criação de uma própria empresa. “Em todos os casos, eles recebem os royalties. Os recursos que forem para o fundo também serão usados em benefício dos índios”, disse o procurador.As áreas de mineração em reservas indígenas serão objeto de licitação. Todos os pedidos de lavra que existem hoje no DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral, autarquia que cuida do setor) serão desconsiderados.”Os pedidos não podem ser considerados porque a atividade não podia existir, por falta de regulamentação”, explicou o procurador.Segundo ele, nos casos em que os índios tenham interesse em explorar diretamente os recursos minerais e empresas comerciais também queiram trabalhar na área, o governo tentará uma solução que permita a convivência dos dois regimes.OrigemA mineração em terra indígena é prevista na Constituição de 1988, mas só pode acontecer após regulamentação, que ainda não existe. O governo começou a estudar o assunto em abril de 2004, quando índios cinta-larga mataram 29 garimpeiros e expulsaram centenas de outros em uma reserva próxima à cidade de Espigão D`Oeste, a 534 km de Porto Velho, em Rondônia.Na época, o foco do conflito era a extração de diamantes. Os índios cinta-larga garimpavam na região em uma jazida que já havia sido explorada por garimpeiros brancos. Os garimpeiros haviam sido expulsos em 2003 pelo governo federal. Sete meses após a chacina, em novembro de 2004, a Polícia Federal indiciou nove índios cinta-larga pelos assassinatos.Dias após o massacre de garimpeiros, o governo já prometia a regulamentação. O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Jorge Armando Felix, sobrevoou a região e afirmou que o governo iria elaborar em “curto para médio prazo” uma legislação para regularizar a extração de pedras preciosas em reservas indígenas.O governo federal chegou a cogitar a hipótese de acelerar o processo de regulamentação, editando normas por meio de decreto ou medida provisória, mas depois abandonou a idéia.
Cimi defende discussão e que índios recebam parte da receita da mineração
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) diz que, em princípio, é contra a exploração de áreas indígenas por mineradoras. “O conselho não vai estimular a exploração, mas é correto que se discuta o assunto”, afirma Paulo Machado, assessor jurídico do Cimi.
O conselho defende que a exploração de minérios nas áreas indígenas não tenha uma lei específica, mas que tenha um capítulo no Estatuto das Sociedades Indígenas, projeto que está parado no Congresso. “Com a discussão do projeto pelo governo, queremos a regulamentação”, disse Machado.
Para ele, a regulamentação passa pela participação de comunidades indígenas carentes nos recursos obtidos pela exploração das mineradoras.
Marcelo Tunes, diretor do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), defendeu que fundos de povos indígenas recebam pela exploração de suas terras, pelo pagamento de royalties, mas disse que a discussão está muito incipiente.
“O Congresso Nacional é o foro para eliminar as divergências sobre a exploração das mineradoras nas áreas indígenas”, afirmou Tunes.
Segundo ele, também não há critérios para definir a disputa entre as mineradoras para a exploração das áreas indígenas. “Cada projeto de exploração vai passar previamente pela aprovação do Congresso e os povos indígenas receberão sua participação pela exploração.”
O projeto de lei do governo federal será discutido na próxima semana durante a Comissão Nacional de Política Indigenista e deve chegar ao Congresso até o segundo semestre deste ano. Duas comissões poderão promover alterações sobre o projeto de lei -a de Direitos Humanos e Minorias e a de Minas e Energia.(VINICIUS ABBATE)
Folha de São Paulo