Governo está disposto a liberar a mineração em terras indígenas
02/04/07
Proposta que vem do Planalto vai sugerir a criação de uma nova lavra garimpeira
BRASÍLIA
RAQUEL ELTERMANN
Da Sucursal
O anúncio de que o governo federal vai enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei que autoriza a mineração em terras indígenas chamou a atenção da Comissão de Minas e Energia da Câmara. Pela primeira vez o governo se dispõe a discutir a criação de uma lavra garimpeira indígena. Trata-se de descobrir os tesouros intactos de 12% do território nacional, e que nunca passaram por um estudo geológico que confirme as riquezas contidas no subsolo. O projeto de lei terá vigência sobre uma área superior a um milhão de quilômetros quadrados, compreendidos, em sua maioria, na Amazônia Legal.
Titular da Comissão de Minas e Energia, a deputada federal paraense Bel Mesquita (PMDB), avalia ser `fundamental` a implantação de regras para o garimpo em áreas de reserva indígena. Antes mesmo de o projeto chegar à apreciação do Congress, Bel Mesquita adianta que antes de tudo é preciso estabelecer rapidamente uma `ordem no garimpo`.
Informações divulgadas esta semana em Brasília citam alguns itens referentes a transações comerciais que podem estar contemplados na proposta governista (veja quadro). Entretanto, a definição dos critérios de mineração em terras indígenas esbarra em questões que vão além do econômico e do social e avançam para a antropologia. `O nó, nisso tudo, mora na filosofia de quem é o índio para nós. Até quando, no século XXI, não se vai dar ao índio a chance da auto-defesa?`, questiona a deputada.
Para ela, o gerenciamento das riquezas do subsolo deve sim ser feito pelos índios e as premissas de um projeto que regularize o garimpo indígena evitarão que o Pará, por exemplo, tenha a violência registrada com a extração de diamantes da Reserva Raposa Serra do Sol (RR). `Eles têm sua própria cultura, dentro do seu espaço, mas se eles quiserem fazer parte da cultura que nós temos, incluindo a transação comercial, tem que ser permitido`, pondera a deputada.
A busca pela legalidade de uma atividade recorrente tanto aos índios quanto aos garimpeiros não índios que ocupam essas terras é vista com otimismo apenas em alguns setores. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) manifestou-se publicamente nesta semana e alega que novas regras, incluindo extração artesanal de minérios por parte dos indígenas, pode afastar investidores para o negócio. Dados do Ibram revelam que o tempo entre a pesquisa do subsolo e extração do minério pode levar até uma década. Assim como os empresários do ramo, os próprios índios ainda não teriam uma posição bem formulada acerca do novo projeto. O tema poderia ser incluído no Estatuto dos Povos Indígenas. Porém, os índios ainda esperam pela aprovação do Estatuto pelo Congresso Nacional há exatos 13 anos.
Bel Mesquita acredita que a solução do impasse não se dará em breve, mas prevê um ponto de partida para que o tema seja ampla e definitivamente debatido. `Espero que os índios venham debater a própria lógica de vida deles aqui (no Congresso). Afinal, o subsolo é brasileiro e aí não há discussão, seja índio ou não. É preciso criar regras de utilização desse subsolo independentemente de quem esteja habitando o solo`.
Para a deputada paraense, a população civil não deve ficar eternamente com o ônus de gerenciar o desenvolvimento econômico das comunidades indígenas. Bel Mesquita questiona o procedimento adotado quando o assunto é questão indígena. `Defendo que os índios têm a capacidade para se auto-determinarem. Não podemos ficar como babás. É um conceito pouco prático que nos coloca como superiores. É aí que mora o preconceito. Nós somos melhores que os índios para tomar conta do que é deles?`.
Mesmo sem estudos oficias, o certo é que as terras indígenas atiçam os olhares da indústria da mineração. Dados divulgados pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) apontam que, até a década passada, foram feitos nada menos que 5.970 pedidos de exploração do subsolo em áreas indígenas. Pelo menos 70% deles foram relacionados à extração de ouro e diamantes.
CONFIRA AS LINHAS GERAIS DO PROJETO
Ainda que não esteja oficialmente formulado, o projeto a ser encaminhado pelo governo federal ao Congresso prevê que:
A área a ser explorada terá de ser paga por hectare. Além disso, os índios teriam direito a 3% do faturamento bruto com o garimpo;
Empresas, associações ou o próprio governo podem requerer autorização para a exploração do garimpo em áreas indígenas;
O processo tem de passar pelo crivo do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), da Fundação Nacional do Índio (Funai), e do Congresso Nacional;
A liberação da área a ser explorada seria feito por leilão e a exploração fica restrito ao minério solicitado. Por exemplo, não pode pedir lavra para bauxita e retirar diamante;
O Ibama continuaria responsável pela liberação das licenças ambientais das lavras;
Os índios podem recorrer à lavra manual em áreas de no máximo 100 hectares, sem a necessidade de aprovação pelo Congresso ou de licitação.
O Liberal-PA