E se a recessão dos EUA chegar aqui?
07/04/08
A possibilidade de recessão nos Estados Unidos neste semestre já provocou estragos nos mercados financeiros de todo o mundo. A hipótese ficou mais realista depois de admitida pelo próprio presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Ben Bernanke. E para a economia brasileira? Se a recessão no país mais rico do mundo for confirmada, segundo economistas ouvidos pelo Estado de Minas/Diario, o Brasil apresenta atualmente algumas cartas na manga que o tornarão menos vulnerável. “O efeito imediato seria mais no plano financeiro, na economia real ele seria menos forte”, diz, por exemplo, o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini. O problema mais evidente estaria nas exportações brasileiras dirigidas aos EUA. “Mas o país melhorou sensivelmente nessa área, reduzindo a participação americana no total das nossas vendas externas”, afirma Agostini. Até o início da década, cerca de 25% das exportações nacionais acabavam no mercado dos EUA – hoje,esse percentual recuou para 17%, graças à diversificação para outras regiões, notadamente Europa, China e Mercosul. João Saboia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, acredita que, por enquanto, qualquer aposta é quase exclusivamente especulativa. “Temos de saber, primeiramente, se haverá mesmo recessão nos EUA. Depois, precisaríamos de observar a duração dessa recessão”, afirma. “Se durar um semestre, ou mesmo até o fim deste ano, seus efeitos sobre a economia brasileira conseguirão ser melhor absorvidos.” Saboia reconhece, entretanto, que a queda da atividade americana teria, potencialmente, efeito maior em outros países, se comparados ao Brasil. “Temos uma vantagem relativa: nossa economia é mais fechada, depende mais do mercado interno, e ele está aquecido, como mostra a própria preocupação do governo federal em estudar medidas para conter o consumo.” O economista-chefe da corretora Gradual, Pedro Paulo Silveira, concorda que a conseqüência maior e mais imediata será na correção dos preços dos ativos financeiros negociados no Brasil. “Para a Bovespa, será terrível, pois o mercado ainda não precificou (ou seja, ainda não incluiu nas cotações das ações) a recessão americana”, diz Silveira. “Quando isso ocorrer, a tendência mais forte é o preço dos ativos cair de forma quase generalizada.” Para Virene Matesco, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), algum reflexo sobre a atividade econômica será visível. “Os EUA, ainda que tenham perdido um pouco de espaço na nossa pauta exportadora, ainda são nosso maior mercado”, afirma, lembrando os últimos resultados da balança comercial, que mostraram saldo negativo. “Além disso, uma recessão nos EUA reduzirá o volume de capitais direcionados ao Brasil, o que será um argumento a mais para o Banco Central elevar a taxa básica de juros (Selic, hoje em 11,25% ao ano).” Uma preocupação constante quando o assunto recessão americana aparece é a queda do preço das commodities, principal item das exportações brasileiras. O presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Paulo Camilo, minimiza o temor. “O mercado está muito aquecido e vai continuar assim”, afirma. “Além do mais, o minério de ferro, por exemplo, é vendido em contratos de longo prazo com China, Coréia e Japão.” Na quarta-feira, um dia depois do discurso pessimista de Bernanke, foi a vez de o economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Simon Johnson, revelar temor. Segundo ele, a economia dos Estados Unidos chegou a um estado de “paralisia virtual”. Segundo ele, fatores como condições financeiras mais rigorosas, preços de energia mais elevados, mercados de trabalho instáveis e um setor de habitação frágil são fatores que irão pesar sobre a economia americana no curto prazo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também aderiu. No Rio Grande do Sul, ainda na quarta-feira, lembrou que a crise americana exige serenidade, sem excesso de otimismo. Para Lula, é preciso muito investimento, muita serenidade neste momento em que a economia brasileira está bem, mas há sinais de que a principal economia do mundo não está. “Não podemos ficar exagerando no otimismo. É preciso que a gente tenha um olhar de lupa a cada santo dia para não permitir que a economia de um país como o Brasil seja contaminada pela crise americana.”
Diário de Pernambuco