E é bom aprender, rápido, a linguagem dos ambientalistas
25/04/08
Os profissionais com formação superior em Ciências Contábeis que optaram pela carreira de auditor têm desafios especialmente complexos à frente. São eles os que mais precisam conhecer as normas internacionais de contabilidade e auditoria, já em vigor no País, e também os que têm de aprender, rapidamente, a falar a linguagem global dos ambientalistas. Esta demanda vem crescendo no compasso acelerado da economia e emerge principalmente durante os processos de fusão e aquisição de empresas, pois já não se fazem negócios sem levar em conta passivos e ativos ambientais, nem eventuais fragilidades nessa área, que podem custar caro no futuro.
Avaliar riscos operacionais, detectar pontos críticos nos processos, prever dificuldades, estudar o ciclo de vida dos produtos, calcular créditos de carbono, elaborar relatórios ambientais e de sustentabilidade são, porém, tarefas para equipes multidisciplinares – além de auditores contábeis, o trabalho exige especialistas em áreas como direito, engenharia e gestão ambiental.
A sociedade brasileira ainda não está tão consciente da necessidade de preservar e recuperar os recursos naturais e ainda associa os problemas nessa área às grandes companhias. Assim, em geral, as pequenas e médias empresas estão de certo modo acomodadas, pois não se sentem pressionadas a aderir a práticas mais sustentáveis.
E as companhias que já se comprometem com tais práticas, nem sempre conseguem agir com eficiência: ?Muitas empresas não investem para resolver pontos críticos, mas mantêm apenas ações difusas. Precisam promover iniciativas que se relacionem com metas de longo prazo e agreguem valor aos produtos?, diz Ernesto Cavasin gerente de soluções em sustentabilidade da PricewaterhouseCoopers. ?Têm ainda de acompanhar os processos e identificar onde é possível melhorar?.
A internacionalização do capital, via investimentos estrangeiros no Brasil e daqui para o Exterior, está contribuindo, contudo, para modificar essa situação. As empresas brasileiras têm de cumprir as leis dos mercados mais exigentes onde têm se instalado e as companhias de fora trazem na bagagem esses critérios, que cedo ou tarde também terão de imperar no País.
As empresas já não podem ignorar a pressão das sociedades, o Protocolo de Kiyoto, a lei Sarbanes Oxley, dos EUA – que passou a exigir mais das companhias de capital aberto para afastar riscos, inclusive ambientais – nem a alta temperatura dos debates sobre o aquecimento global. ?Atualmente, cerca de 20% das notícias veiculadas na mídia têm foco social ou ambiental e de sustentabilidade?, informa Cavasin.
O especialista lembra que a forma de atuar de uma empresa pode criar riscos à sua imagem perante o consumidor, mas o que deve preocupá-las ainda mais é a ameaça que uma operação em desconformidade com normas ambientais traz à sua própria sobrevivência. Ele exemplifica: ?Se a produção depende de água e a companhia não trata ou reusa a água, poderá ter de arcar depois com custos adicionais ou se tornar inviável?.
O aumento da concentração de empresas (fusões e aquisições) nos últimos anos é outro fator de impulso à demanda por auditorias ambientais, segundo Cavasin, pois é preciso levantar o histórico ambiental dos parceiros. A aquisição ou instalação de lojas de uma rede de varejo, por exemplo, implica numa série de licenciamentos, relacionados a geração de esgotos, resíduos, iluminação. ?As empresas sempre causam impactos nas áreas onde se instalam e têm de buscar formas de atenuar esse impacto?, diz o especialista.
Relatórios
Ainda que não tenham obrigação legal de fazer e divulgar relatórios ambientais e de sustentabilidade, apenas de fornecer informações pontuais ao mercado, principalmente as maiores empresas, que precisam ser mais transparentes, estão adotando essa prática.
As instituições financeiras aparecem com destaque na relação das companhias brasileiras que a adota, refletindo, provavelmente, o fato de estarem entre as mais pressionadas a agir contra a destruição dos recursos naturais. Tal pressão ficou evidente em 2002: os dez maiores bancos do mundo firmaram os Princípios do Equador, conjunto de critérios mínimos sobre impactos ambientais e sociais a ser observado nos projetos que demandam financiamento bancário superior a US$ 50 milhões.
Ainda assim, suas vitrines têm sido um dos alvos preferidos das entidades que acompanham as ações corporativas, como a BankTrack, rede internacional de ONGs que monitora o setor financeiro. A entidade divulgou, em dezembro, o relatório Mind the Gap, que pontua com notas muito baixas a atuação dessas empresas.
Companhias dos setores de mineração, papel e celulose e energia também se evidenciam entre as que publicam relatórios ambientais. Mas isso ainda não tem surtido os efeitos almejados. Para o economista Gustavo Pimentel, da ong Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, muitas empresas ainda praticam o que ele chama de “maquiagem verde? e usam a sustentabilidade mais como estratégia de marketing do que instrumento real, inserido de fato nos negócios.
As reações a essa desconfiança da sociedade têm se refletido em tentativas de melhorar o desempenho e reportar as ações ao mercado: pelo menos 44 grandes empresas brasileiras de setores variados, inclusive o financeiro, já publicam relatórios de sustentabilidade de acordo com as normas da rede internacional Global Reporting Initiative (GRI), o modelo mais empregado atualmente no mundo para demonstrar a responsabilidade sócio-ambiental das corporações. A primeira companhia verde-amarela a adotar o padrão foi a Natura, em 2003.
Nos países desenvolvidos, essa prática remonta aos anos 1970. No Brasil, começou a ser discutida em meados da década de 1990, quando também se começou a apontar a necessidade de as empresas adotarem balanços sociais. ?Os relatórios de sustentabilidade são, por enquanto, voluntários. No futuro, serão obrigatórios?, diz Marcelo Drüg Vianna, da Deloitte.
(CD)
Padrão internacional
Empresas brasileiras que divulgam relatórios de sustentabilidade de acordo com as normas GRI, as mais adotadas no mundo:
Aracruz Celulose
AES Eletropaulo
AES Sul Distribuidora Gaúcha de Energia
AES Tietê
AES Uruguaiana
Alcoa Alumínio
AmBev
Ampla Energia e Serviços
Banco ABN Amro Real
Banco Bradesco
Banco Itaú Holding Financeira
Bunge
Celulose Irani
Cia Energética de Minas Gerais
Comgás
Companhia Energética do Ceará – Coelce
Companhia Paranaense de Energia
Copesul
CPFL Energia
CST-Arcelor Brasil
Holcim
McDonald`s
Medley
Natura Cosméticos
Petrobras
Philips do Brasil
Samarco Mineração
Santander
Serasa
Shell Brasil
Siemens
Souza Cruz
Suzano Papel e Celulose
Suzano Petroquímica
Takaoka
Telecomunicações de S. Paulo
Telesp Celular Participações
Usinas Siderúrgicas de MG
Veracel Celulose SA
Votorantim Celulose Papel
Fonte: site da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje)
Diário do Comércio – SP