Decisão do TRF dá vitória ao Cade contra a Vale
27/03/07
Juliano Basile27/03/2007
Por dois votos a um, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília negou recurso da Vale do Rio Doce para anular a votação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no julgamento da compra de oito mineradoras pela empresa. O TRF concluiu que o Cade agiu corretamente ao computar o voto da presidente do órgão, Elizabeth Farina para desempatar o julgamento.
Em 10 de agosto de 2005, o Cade decidiu o caso Vale com votos da presidente e de mais cinco conselheiros. Após um empate em três votos a três, o voto de Farina foi considerado como “voto de qualidade” e acabou determinando a imposição de condições à companhia: a venda da mineradora Ferteco ou a perda do direito de preferência na compra de minério de ferro da Casa de Pedra, mina de propriedade da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A Vale recorreu à Justiça contra a decisão e o processo foi julgado, ontem, no TRF. A companhia recorreu, então, ao Judiciário, onde alegou que o voto de Farina não poderia ter sido computado para o desempate. A Vale obteve liminar para não seguir as condições do Cade, mas, ontem, a companhia foi derrotada e, agora, prevalece a decisão do Conselho.
O procurador-geral do Cade, Arthur Badin, afirmou que a Vale terá de cumprir uma dessas duas condições após o TRF publicar a decisão no “Diário da Justiça”. “Assim que a decisão for publicada, a Vale terá de cumprir uma das duas condições”, ressaltou Badin.
Já o advogado Pedro Gordilho, que representou a Vale junto ao TRF, disse que cabe recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, portanto, ainda é necessário aguardar novos julgamentos para se ter uma certeza maior sobre o caso. “Essa decisão não faz com que a Vale tenha que cumprir imediatamente as condições impostas pelo Cade”, afirmou Gordilho. “Ainda vamos nos reunir e analisar as possibilidades de recurso”, completou o advogado da Vale.
Gordilho defendeu a tese de que Farina não poderia ter proferido o “voto cumulativo”. Para ele, como houve empate, o Cade deveria ter aplicado “a sanção menos onerosa” à empresa. Esta sanção seria limitar ao mercado interno o excedente de minério de ferro de Casa de Pedra.
Já a Procuradoria do Cade alegou que o “voto de qualidade” está previsto na Lei de Defesa da Concorrência (nº 8.884) e é aplicado em outros processos. Arthur Badin listou 35 processos que foram decididos pelo “voto de qualidade” no Cade e ressaltou que outros órgãos também usam essa prática, como a Anvisa, a CVM e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Disse ainda que a decisão no caso Vale “é a mais importante dos 45 anos de história do Cade”.
O relator do processo no TRF, desembargador Antônio de Souza Prudente, deu razão à Vale. “A senhora presidente do Cade votou duplamente, não prevalecendo voto de qualidade, mas voto cumulativo”, disse Prudente. Mas, os outros dois magistrados que foram convocados para atuar na sessão de ontem concluíram que o Cade agiu corretamente no caso Vale.
A desembargadora Maria do Carmo Cardoso afirmou que o “voto de qualidade pode ser cumulado num mesmo julgamento”. “Não posso entender que este julgamento do Cade se deu ao arrepio da lei”, afirmou. E o juiz Carlos Brandão ressaltou a importância da atuação do Cade no combate aos monopólios. Ele disse que a Constituição de 1988 viabilizou a quebra dos monopólios públicos, mas que ainda existem os monopólios privados. Para o juiz, cabe ao Cade decidir estes casos e “o Brasil não pode aguardar indefinidamente” por uma solução. Assim, segundo ele, o Cade agiu corretamente ao aplicar o “voto de qualidade” para decidir o caso Vale.
Maria do Carmo e Brandão não são da 6ª Turma, mas foram convocados por Prudente para a sessão de ontem em razão da ausência dos titulares. Brandão é juiz no Piauí e Maria do Carmo atua no próprio TRF, mas em outra seção. Prudente havia convocado o juiz David Wilson Pardo, do Acre, para atuar na sessão de ontem, mas ele se declarou impedido por motivo de foro íntimo, sem especificar qual. Prudente disse que todos os juízes são capazes de votar casos como este. “Todo o juiz está plenamente habilitado para exercer a sua função”, afirmou.
O diretor de novos negócios e mineração da CSN, Jayme Nicolato Corrêa, disse que a decisão “foi uma vitória do direito administrativo antitruste no país, pois o que se julgava era um direito legítimo do voto de qualidade previsto no estatuto do Cade”. Com isso, afirmou, a empresa fica mais confortável para levar avante seu plano de expansão de Casa de Pedra de US$ 1,5 bilhão, para produzir 55 milhões de toneladas até 2010 para venda no país e no exterior.
O Cade informou em nota que a decisão do TRF sinaliza que o Judiciário “não dará guarida a ações judiciais que pretendam obstaculizar o cumprimento das decisões do Cade com meras filigranas ou sutilezas jurídicas”. “A decisão reforça a confiança do Cade, de seus Conselheiros e Procuradores Federais na independência e competência técnica do Poder Judiciário brasileiro”, diz em sua nota.
Valor Econômico