Produtores menores mudam o mercado de diamantes
26/02/07
The Economist26/02/2007
Os diamantes estão de novo em evidência. As pedras, que já foram citadas na tela por Marilyn Monroe como as melhores amigas da Mulher, estão sendo agora retratadas por Hollywood como os piores inimigos da África. No filme “Diamante de Sangue” Leonardo DiCaprio faz o papel de um mercenário à caça de pedras preciosas durante a guerra em Serra Leoa na década de 1990. Mas na verdade, o caráter do setor – que produz um valor estimado em US$ 13 bilhões em pedras brutas e mais de US$ 62 bilhões em jóias – mudou muito desde então.
A maior parte dessa transformação se deve ao fato de que a De Beers, a companhia que já controlou grande parte da oferta de diamantes brutos, não tem mais tanto poder e uma legião de produtores menores está emergindo. Autoridades reguladoras da Europa e Estados Unidos e governos de países da África também vêm promovendo mudanças, e os diamantes de “sangue” quase desapareceram. Como resultado, o comércio de diamantes começa a ter um contorno mais parecido com o de qualquer outra indústria comum.
Segundo Gareth Penny, diretor-gerente da De Beers, o negócio dos diamantes está deixando de ser controlado pela oferta para ser conduzido pela demanda. No começo dos anos 1990 a gigante dos diamantes produzia 45% dos diamantes brutos do mundo, mas vendia cerca de 80% da oferta total, regulando o mercado através da administração do estoque.
Depois que a nova administração chegou, no fim dos anos 1990, a De Beers mudou de conduta. Sua principal unidade comercial parou de comprar diamantes no mercado aberto. A companhia fechou o capital em 2001 e agora é controlada pela Anglo American, a família Oppenheimer e o governo de Botsuana. Ela resolveu uma prolongada disputa anti-truste com as autoridades reguladoras americanas. E prometeu à União Européia que até 2009 deixará de comprar diamantes da ALROSA, a companhia estatal russa que extrai cerca de 20% da produção mundial, com o objetivo de promover a competição. Hoje, a De Beers vende cerca de 45% de todos os diamantes brutos e sua parcela na produção é de cerca de 40%.
Na medida em que o mercado fica mais dinâmico, a De Beers está investindo pesadamente na exploração, desenvolvendo quatro minas no Canadá e África do Sul, e vendendo operações com desempenhos considerados insatisfatórios. A gigante dos diamantes estabeleceu uma rede de joalherias numa joint venture com o LVMH, o conglomerado de luxo. Ela agora gasta cerca de US$ 200 milhões por ano em marketing – o que é vital para convencer as pessoas a comprarem “somente os originais”. Os diamantes sintéticos já abocanharam 90% do mercado industrial, mas têm poucas incursões no ramo das jóias, por enquanto.
Empresas menores como a Kimberley Diamond Group, Trans Hex e Gem Diamonds se apressam para preencher a lacuna existente entre os grandes produtores e os produtores menores. A Petra Diamonds, outra empresa pequena, acaba de comprar uma das minas da De Beers na África do Sul. Ela também está para iniciar a produção em Serra Leoa e está otimista com a exploração em Angola, onde está trabalhando com a BHP Billiton. A companhia espera produzir 500.000 quilates até 2010, número que no ano passado foi de 175.000 quilates. Mas isso ainda é muito pouco perto do recorde de 51 milhões de quilates conseguido pela De Beers em 2006.
Hoje, a De Beers vende cerca de 45% de todos os diamantes brutos e sua parcela na produção é de cerca de 40%.
Enquanto isso, Lev Leviev, o reservado magnata dos diamantes, vem estabelecendo unidades de corte e lapidação na África, comprando algumas pedras brutas de governos e caminhando para a produção, pressionando mais a De Beers. “Leviev é uma das forças que estão por trás da revolução na De Beers”, diz Richard Chase, do banco de investimento Ambrian Partners, embora Gareth Penny não concorde com isso.
O que é certo é que a África, que produz 60% dos diamantes do mundo, pretende mais do que apenas fornecer pedras brutas. “A De Beers não conseguiu avaliar adequadamente as aspirações dos governos africanos”, diz Chaim Even-Zohar, um destacado especialista em diamantes. “Agora é a hora do troco.” Idos são os dias em que os diamantes eram embarcados para Londres para serem selecionados e agrupados em lotes antes de serem vendidos.
Em janeiro, a companhia fez um acordo com o governo da Namíbia pelo qual todos os diamantes produzidos por sua joint venture serão selecionados em casa, e pedras avaliadas em cerca de US$ 300 milhões, pouco menos de metade da produção, também serão vendidas localmente. Na semana passada a De Beers, que já vendeu 26% de seu braço sul-africano para um consórcio de controle negro, disse que vai fundir sua mina de Namaqualand com uma empresa estatal de diamantes para criar uma nova produtora local independente. E até 2009 todas as pedras da De Beers vindas de todas as partes do mundo serão enviadas para um prédio com fachada de vidro na capital de Botsuana, para serem agregadas. Tudo isso mostra que os recursos minerais não precisam ser sempre uma maldição.
Os produtores africanos também estão ansiosos para cortar e lapidar seus próprios diamantes, o que acrescenta cerca de 50% ao valor das pedras brutas, e ainda mais no ramo das joalherias. Embora continue sendo um grande entroncamento do comércio de diamantes, Antuérpia não é mais o centro mundial do corte de lapidação. Quase todos os diamantes são agora cortados e lapidados na Índia ou na China, mas os produtores africanos esperam abocanhar uma parcela dos negócios.
E os diamantes de sangue? Hoje, afirma Alex Yearsley da Global Witness, eles representam uma fração diminuta da produção mundial. Mas as artimanhas de Leonardo DiCaprio nas telas despertaram a consciência sobre o problema. Embora seja um grande passo adiante, o processo da Kimberley – um esquema de certificação montado em 2002 para garantir que os diamantes não estão sendo usados para comprar armas – não é perfeito, e os diamantes de sangue ainda têm espaço no mercado. A De Beers afirma que a exibição do filme nos Estados Unidos pouco antes do Natal não chegou a afetar as vendas das joalherias. Mas agora um número maior de clientes quer saber de onde vêm os diamantes que compram.
Esta é uma boa notícia para os produtores que têm como provar a procedência de suas pedras. O Canadá desenvolveu um esquema de certificação para seus diamantes e desde 2004 a De Beers está vendendo algumas pedras na Ásia com sua Forevermark, um entalhe microscópico que garante a origem dos diamantes.
Mesmo assim, a Global Witness diz que o setor não é hoje muito mais transparente do que era poucos anos atrás. O contrabando é comum, especialmente em países como Angola e a República Democrática do Congo, e diamantes ilegais ainda chegam aos países ricos. Cerca de 1 milhão de garimpeiros informais ainda vasculham os rios da África em busca de diamantes aluviais, sempre em condições degradantes. O processo da Kimberley foi desenhado para conter o fluxo dos diamantes de conflitos, afirma Willie Nagel, um comerciante internacional de diamantes que foi importante em sua montagem, mas “os diamantes livres de conflitos não devem ser confundidos com os diamantes éticos”. Mineradoras e grupos voluntários estão trabalhando para aperfeiçoar a questão. Hollywood poderá não procurar Leonardo DiCaprio para a sua próxima representação do setor, mas isso não é certeza nenhuma de que também vai procurar uma nova Marilyn Monroe.
Valor Econômico