Um modelo de desenvolvimento
20/10/08
O principal desafio na Amazônia é recorrer à inigualável diversidade social, étnica, cultural e ambiental como fonte para gerar riquezas, sem destruí-la. O desafio é, portanto, o desenvolvimento sustentável.
Este desafio é ilustrado, ainda que de forma enviesada, pela grande imprensa, inclusive internacional: quando o Brasil endurece as regras ambientais para preservar a floresta e a diversidade amazônicas, é acusado de travar o desenvolvimento; quando se divulgam números sobre desmatamento, a acusação é de não ser capaz de gerir com responsabilidade os próprios recursos naturais.
No Pará, a questão ambiental não envolve apenas empresários, como os ligados aos setores da mineração, da madeira, da pecuária, mas também a agricultura em pequena escala, praticada por milhares de famílias de comunidades interioranas e ribeirinhas.
Como equacionar tais contradições e desafios? Com um modelo de desenvolvimento que recorre à diversidade como fonte de competitividade, que agrega maior intensidade tecnológica a produtos e processos, e que promove a interação proativa entre grandes e pequenas empresas e produtores. E com uma meta clara: crescer 25% em quatro anos e criar as condições para, em 2014, chegar aos 50% em relação a 2006.
Esse novo modelo, que induzimos com medidas efetivas e significativas, se funda em três alicerces: investimento em capital fixo, como infra-estrutura e logística; capital humano (mais educação, principal forma de aumentar a produtividade média da população) e capital social (é preciso que os atores confiem uns nos outros, governo, empresários, sindicatos).
Quanto ao capital fixo, alguns dos setores que mais receberão investimentos no Brasil, até 2010, são indústria siderúrgica (R$ 37,1 bilhões) indústria de papel e celulose (R$ 20 bilhões), além de projetos estruturantes: R$ 274 bilhões em energia, R$ 58,3 bilhões em logística e R$ 170,8 bilhões em infra-estrutura social e urbana.
O governo do Pará implementou um conjunto de ações para disputar parte significativa destes recursos. Assim é que garantimos junto ao governo federal investimentos de mais de R$ 10 bilhões, que vão concretizar reivindicações históricas do Estado, como o asfaltamento da BR-163 e a conclusão das duas eclusas de Tucuruí. Também será ampliado o porto de Vila do Conde e construída a hidrovia do Tocantins nos trechos que ligam Marabá a Tucuruí e Tucuruí ao Porto de Vila do Conde.
O setor privado também vai investir de forma inédita: só a Vale planeja aplicar mais de R$ 30 bilhões até 2012. Estes investimentos se coadunam com várias ações articuladas de desenvolvimento, como o zoneamento econômico-ecológico, que vai indicar com clareza onde investir e dar garantia institucional para potencializar os investimentos.
O capital fixo envolve também a atração de empreendimentos e o governo do Estado mobiliza recursos de quase R$ 30 milhões para recuperar e construir Distritos Industriais em pólos como Marabá, Santarém e Barcarena.
Quanto ao capital humano, o governo reivindicou duas novas universidades federais para o Estado: garantiu a do Oeste do Pará, com sede em Santarém, que vai permitir a contratação de mais de 500 doutores em áreas variadas. Investe, pelo programa Bolsa Trabalho, na qualificação de 120 mil jovens até 2010. (Esta qualificação se coaduna com as necessidades das empresas, inclusive com a formação de turmas específicas para demandas imediatas.)
Integrando, de forma direta, capital fixo e capital humano, há duas ações significativas: o programa Navega Pará, que já recebeu investimentos do Estado de mais de R$ 30 milhões e vai levar internet de alta velocidade a dois milhões de pessoas, além de interligar por fibra ótica os principais órgãos públicos e promover ações de segurança, saúde e educação; e a construção de três parques de ciência e tecnologia (em Belém, Marabá e Santarém) com foco de pesquisa de acordo com a vocação econômica da região e que vão reunir, em torno da inovação, empresários, pesquisadores e governo do Estado.
A capacidade de desenvolvimento do Estado passa, necessariamente, pela inovação. Ser capaz de criar arranjos institucionais que medeiem, que articulem a produção de ciência, tecnologia e inovação planetárias com a socioeconomia de cada território. Arranjos institucionais que, em suas muitas facetas, já contabilizam realizações excelentes na área da ciência e da tecnologia: além dos parques de ciência e do Navega Pará (que é, por si, um sistema público e gratuito de comunicação, transmissão e recepção de dados), destaque-se a criação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Pará (Fapespa) e a recriação do Instituto de Pesquisas Socioeconômicas e Ambientais do Estado (Idesp). Este esforço para consolidar a base de um sistema de ciência e tecnologia deve se transformar, de política de um governo em política de Estado, com a aprovação, até o final do ano, pela Assembléia Legislativa, da Lei da Inovação, que trará regras claras e incentivos para as empresas inovarem.
Os arranjos institucionais (que fortalecem o capital social, como o Fórum Paraense de Competitividade) são articulados em torno do Sistema Paraense de Inovação (Sipi).
O Sipi tem o desafio de reunir, em ambientes de sinergia, as necessidades de mercado e empresariais; as políticas públicas do governo, como demandas na área da saúde; e a comunidade científica. Esta união, este diálogo, permite não apenas o desenvolvimento de novos produtos, como contribui para a eliminação de gargalos tecnológicos ao desenvolvimento. Uma conseqüência direta são os cinco laboratórios que o governo conquistou junto à Finep, mediante contrapartida de R$ 6 milhões, que vão trazer soluções nas áreas da fitossanidade e manejo animal, óleos vegetais, biotecnologia, entre outras.
O Fórum Paraense de Competitividade, integrante do Sipi, reúne empresários, sindicatos, secretarias de governo, instituições de fomento (Banpará, Basa, Sudam, BNDES), entre outros representantes dos diversos setores sociais, para identificar gargalos à competitividade, ouvir e fazer sugestões, com o fim de gerar políticas públicas capazes de tornar mais competitiva não apenas uma empresa, mas uma cadeia produtiva, uma região, o Estado como um todo: não uma competitividade `individual`, mas sistêmica.
O Fórum foi dividido em diversos grupos de trabalho, que fazem reuniões propositivas com identificação dos gargalos e dificuldades e também registraram reivindicações e sugestões dos empresários e outros setores. As reuniões, de certa forma, funcionaram como uma radiografia da economia paraense – uma realidade complexa na qual, pela primeira vez, os agentes locais são seriamente vistos como vetores do desenvolvimento, impulsionadores de crescimento econômico.
As respostas são rápidas e diretas, nas reuniões do pleno do Fórum Paraense de Competitividade, a cada três meses, quando a governadora Ana Júlia Carepa anuncia, pessoalmente, o resultado do monitoramento das propostas e também as medidas governamentais originadas nos grupos de trabalho.
Isto é fortalecimento do capital social, isto é ambiente institucional favorável ao desenvolvimento: o governo do Estado não está fazendo bravatas, vendendo ilusões, propondo metas inalcançáveis. Pelo contrário – tem um projeto claro de desenvolvimento, com ações já implantadas e em implantação, e que envolve como vetores de crescimento tanto a academia quanto o ribeirinho, tanto empresas como a Vale quanto agricultores familiares. Um modelo que incorpora sugestões e reivindicações históricas do movimento social. Um modelo ambientalmente sustentável que, baseado na produção e circulação de informação e na distribuição de renda, se respalda na mobilização social para se concretizar. Ou seja, precisa primeiro ser política social, beneficiar a população, prepará-la para receber a qualificação, o conhecimento, a tecnologia.
Não basta investimento e crescimento econômico (até hoje, o crescimento beneficiou poucos, como atesta o Índice de Desenvolvimento Humano do Pará, um dos mais baixos do Brasil), é preciso que haja um enraizamento do desenvolvimento, que ele beneficie, de formas diretas, as cidades que recebem os aportes de grandes investimentos. Assim é que o governo do Estado desenvolve uma agenda específica com o setor mineral (o que mais vai investir aqui até 2012) em ações como planejamento urbano e regional, projetos socioambientais e de transbordamento de tecnologia para as áreas de entorno dos empreendimentos.
Este é o nosso desafio, e estas são as principais ações implementadas, a curto, médio e longo prazos. Sabemos que não pode ser um projeto apenas do governo, de um Estado, de uma região: a Amazônia (desenvolver sem destruir) deve ser uma prioridade nacional; o governo do Estado já deu significativos passos – sem bravatas, sem mentiras, repito – e sabe que sem a união de todos não se avançará muito. O nosso convite não deixa dúvidas: enfrentar juntos o desafio do movimento sustentável e da competitividade sistêmica, promovendo o desenvolvimento para todos.
Maurílio de Abreu Monteiro é doutor em desenvolvimento sustentável, secretário de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia.
O Liberal – PA