Pará assume até 2018 a liderança nacional na produção de minérios
08/09/08
O Pará deverá assumir até 2018 o primeiro lugar no ranking nacional dos produtores de minérios. Essa ascensão consolidará definitivamente sua posição de relevo enquanto jurisdição mineral. A afirmação é de Eduardo Vale bacharel em economia com especialização em economia mineral, em entrevista ao PARÁ NEGÓCIOS, publicada também em O PARAENSE. Diretor-presidente e sócio principal da Bamburra – Planejamento & Economia Mineral, Vale tem 37 anos de experiência na indústria de mineração. Desde 1986, dedica-se à consultoria independente. Mas Eduardo Vale alerta que o Pará precisará investir na formação e na capacitação de recursos humanos direcionados para o mineral-negócio. Para ele, a falta de uma secretaria, ainda que, do tipo ?mineração, indústria e comércio?, aponta insensibilidade com relação à importância do setor mineral e seu potencial de contribuição para o desenvolvimento do Estado. Ele considera que, qualquer alteração hoje no percentual dos royalties pago pela atividade mineral ?nos parece custosa, carregada de risco e despropositada?. ?Se equívocos forem cometidos, os maiores prejudicados serão os estados, municípios e comunidades?, afirma. Ele considera possível a exploração mineral em terras indígenas e destaca o desempenho da Vale, que ?tem sido fantástico na atração de sócios produtores e consumidores de aço e minério de ferro?. Eduardo Vale ressalta ainda que, ?muito embora o setor público seja deficiente em prover a infra-estrutura adequada, como ocorre há décadas, a mineração empresarial muitas vezes consegue preencher as lacunas?. ?Não é por acaso que a mineração brasileira ocupa papel de destaque no setor ferroviário, na geração de energia e no setor portuário?, afirma. PARÁ NEGÓCIOS – Está sendo travada no momento uma polêmica sobre o aumento dos royalties pagos pelas empresas para a exploração dos recursos minerais. Qual sua opinião a respeito? Considera baixo o valor pago atualmente? Acha que deve aumentar? EDUARDO VALE – Primeiramente, em uma resposta direta e sucinta, me posiciono sempre contra o aumento de imposto. Veja o caso da CPMF. Originalmente, de transitória e comprometida com a saúde tentaram transformá-la em permanente. Durante o processo de discussão, a sociedade brasileira descobriu que a CPMF estava comprometida com tudo menos com a saúde. Considerando o desempenho da arrecadação federal e a qualidade da política de gastos da União, tudo indica que a CPMF não está fazendo falta. Quanto à saúde, bem, o problema não parece ser a falta de recursos e sim de gestão. Ainda assim, o governo federal vai tentar reeditá-la sob outra denominação. Eu sou contra. Historicamente, o brasileiro é esmagado pela sanha arrecadadora dos governos e pelos baixos níveis de governança e de eficácia na aplicação dos recursos. Essas disfunções estão refletidas na qualidade dos serviços públicos oferecidos. Assim sendo, enquanto brasileiro e profissional da mineração, vejo com sérias reservas qualquer sugestão nesse sentido. Deve-se considerar que a carga tributária do Brasil é reconhecida como muito alta. Em se tratando da mineração, além da alta carga ?normal? incidente, a empresa está sujeita às contribuições, taxas e emolumentos específicos. Esses vetores elevam ainda mais a carga tributária final efetiva da mineração. Assim sendo, na margem, em termos de carga tributária efetiva, qualquer aumento poderá ter um impacto expressivo; No que concerne aos royalties, como é conhecida a compensação financeira sobre a produção mineral (CFEM), nosso sistema especialista de informações em economia mineral indica que a alíquota geral (3%) está alinhada com as alíquotas adotadas por vários países de vocação mineira, inclusive latino-americanos. Diga-se de passagem que, até 2006, Peru e Chile, por exemplo, cobravam percentuais inferiores aos vigentes no Brasil. Atualmente, os percentuais médios adotados por esses países estão na vizinhança da CFEM; O que aconteceu é que, a partir de 2003, com os aumentos acentuados nos preços dos bens minerais várias jurisdições (países, estados e províncias) passaram a rever suas alíquotas, procurando corrigir distorções ou até mesmo abocanhar parcelas mais significativas da renda econômica gerada pelos empreendimentos. O grande desafio que as jurisdições mais ousadas enfrentam é manter a competitividade da indústria quando o inevitável ciclo de preços baixos vier a se manifestar, o que, diga-se de passagem, muitos acreditam ter começado. Destaque-se ainda, que em alguns países as revisões das alíquotas estão inseridas em uma reforma mais ampla do regime tributário usualmente mais arcaico do que o brasileiro. Esse aspecto deve ser considerado sob pena de gerar distorções. Nosso entendimento é que, em geral, a experiência brasileira com a CFEM parece bastante eficaz quando comparada com outros países. Após a Constituição, sua adoção representou transição serena a partir do regime anterior – Imposto Único Sobre Minerais (IUM) – e ofereceu estabilidade para o planejamento empresarial. A indústria de mineração tem um longo prazo de maturação e, portanto, necessita de estabilidade para planejar sua alocação de capital no longo prazo. Até 2005, a CFEM estava alinhada com o extrato superior do intervalo mediano das alíquotas vigentes nas principais jurisdições minerais. Por outro lado, ao longo do período 1995-2005, manteve-se sempre acima (50%) da alíquota média adotada nas transações envolvendo pagamento de royalties entre empresas de mineração na América Latina. Esse aspecto histórico é muito importante para a política mineral na medida em que sugere que o patamar atual da CFEM é sustentável quando focado no longo prazo de modo a incorporar ciclos de depressão nos preços; Assim sendo, qualquer alteração agora nos parece, custosa, carregada de risco e despropositada. Na realidade, os aspectos que carecem de aprimoramento imediato dizem respeito à fiscalização da arrecadação e ao robustecimento da governança na aplicação dos recursos, particularmente por parte das prefeituras. A aceleração dos convênios do DNPM com as prefeituras é fundamental do lado da arrecadação, embora insuficiente para equacionar a questão da governança; Apesar dessas ponderações, entende-se o reclamo dos estados que se sentem prejudicados, especialmente no caso dos bens minerais cujas alíquotas são excepcionalmente inferiores aos 3%. Nesse caso, inclui-se o minério de ferro, cujo enquadramento refletiu os entendimentos que vigoravam à época do IUM. Este é o cerne da demanda atual. Não há dúvida de que se o Brasil operasse de fato como uma federação, na qual a carga tributária não fosse extremamente elevada e não estivesse concentrada nas mãos do governo federal, a eventual revisão e identificação de uma solução de compromisso seria muitíssimo facilitada. Espero que essa discussão esteja lastreada em informações e análises pertinentes sobre a realidade nacional e internacional para que possam subsidiar efetivamente a etapa política do processo decisório. Pois uma coisa é certa, ?ao final do dia?, se equívocos forem cometidos os maiores prejudicados serão os estados, municípios e comunidades. PARÁ NEGÓCIOS – O setor mineral sempre foi visto como agressivo ao meio ambiente. Falava-se que saia o minério e ficava o buraco. Como está essa questão hoje? Quais os avanços ambientais obtidos no fechamento de uma mina? EDUARDO VALE – A legislação brasileira sobre fechamento de mina (PRAD) é muito limitada e genérica, carecendo de um maior detalhamento. A despeito dessa omissão do setor público, a mineração brasileira, moderna e empresarial, tem feito um grande trabalho na área ambiental. Os avanços implementados na prevenção e proteção; controle e monitoramento; descomissionamento e fechamento; e restauração e remediação são notáveis. A experiência brasileira, expressa na adoção das melhores práticas e na crescente conquista das certificações pertinentes, situa o País no quartil superior dos países mineiros, sendo reconhecida internacionalmente. A bem da verdade, em muitos casos os procedimentos e soluções adotados pelas empresas situam-se além do que é requerido pela legislação em vigor. É inegável que as pequenas e médias empresas enfrentam maiores dificuldades em cumprir a legislação. Por outro lado, existe um passivo histórico nas regiões de maior concentração que precisa ser gerenciado e compatibilizado sob a legislação em vigor. Em um evento recente ? Encerramento de Mina – promovido pela FEAM (MG) e pelo IBRAM, essa realidade foi abordada. Em se tratando do Pará, todavia, ao contrário do que aconteceu em Minas Gerais, tem-se a possibilidade de avançar no processo de industrialização mineral sem repetir os mesmos erros. Seja por força da legislação mais moderna em vigor, seja pelo amadurecimento e maior capacidade de auto-regulação da indústria, em nível das grandes empresas. Nesse particular, as características e os desafios da mineração na Amazônia e suas implicações na escala econômica mínima das operações reservam às grandes empresas papel crucial; Em termos de iniciativas governamentais, foi mencionado pelo representante do DNPM no evento que haveria um grupo de estudos, criado por volta de 2001/2002, encarregado de estudar a problemática do fechamento de mina. Mas, não tenho maiores informações acerca dos possíveis resultados desse estudo; Em um contexto mais amplo, a problemática do fechamento de mina está inserida no desafio de contribuir para a sustentabilidade regional ou da comunidade. Essa componente específica da responsabilidade social da empresa de mineração, em se tratando do Brasil, é relativamente recente, inclusive porque o número de casos significativos de fechamento não são numerosos. Ainda assim, existem vários projetos de reaproveitamento dos sítios minerados visando à implantação de áreas de proteção ambiental, áreas destinadas à cultura e ao lazer etc. Em escala regional, o caso mais significativo é o de Serra do Navio. Além do legado altamente positivo manifesto na infra-estrutura portuária e ferroviária oferecida à sociedade amapaense, destacam-se as inúmeras oportunidades de investimentos geradas pela exploração mineral realizada durante a vida útil da mina. Essas oportunidades, agora implantadas ou em desenvolvimento, assim como aquelas identificadas mais recentemente, irão se beneficiar dessa bendita infra-estrutura. Na minha opinião, as eventuais disfunções e impasses ocorridos no encerramento de Serra do Navio, mais uma vez, estiveram (ou estão) associadas a omissão e falta de planejamento dos setores públicos federal e estadual em assumir as responsabilidades que lhe cabiam, tendo em vista o requerido contratualmente à concessionária 50 anos atrás. PARÁ NEGÓCIOS – Outra polêmica diz respeito à exploração mineral em terras indígenas. Você acha possível? Como os índios podem ser beneficiados? EDUARDO VALE – Sim, acho possível. A experiência internacional endossa essa expectativa. Minha tese de doutoramento aborda a questão. Na verdade, minha visão é de que todos podem ganhar. A inadimplência do Congresso, no detalhamento dos dispositivos constitucionais, acarreta alto custo de oportunidade à Nação, aos estados, às regiões de influência das Terras Indígenas e às comunidades indígenas. Conceitualmente e de forma simplificada, esse custo pode ser aproximado com base no fluxo de benefícios líquidos, passível de ser gerado pelo aproveitamento da riqueza mineral já conhecida, assim como aquela riqueza em condições de ser descortinada pelas novas campanhas exploratórias que seriam realizadas. Naturalmente, as etapas e os desafios a serem vencidos são expressivos e demandarão dos três poderes esforços institucionais bem articulados na concepção, implantação e cumprimento efetivo da legislação. Ainda que lentamente, caminhamos nessa direção. Pelo lado dos povos indígenas brasileiros, o grande desafio reside na eficácia do processo decisório comunitário quando confrontado com o mundo não-índio. Esta interface tem se mostrado problemática. Existem exemplos nos quais lideranças legítimas foram acusadas de apropriação dos benefícios e recursos que, de início, deveriam ser distribuídos para elevar o bem-estar e reforçar a sustentabilidade da comunidade. Com a palavra os antropólogos… Acredito que a essência da experiência internacional, entendida como o conjunto de vetores que formatam os acordos selecionados entre empresas de mineração e comunidades indígenas, é passível de ser reproduzida no País, respeitadas as características, as restrições e o estágio diferenciado de desenvolvimento das comunidades indígenas brasileiras que configuram a realidade nacional. Os acordos foram estruturados em torno dos postulados do desenvolvimento sustentável, com base em um pacote típico de benefícios econômicos, financeiros e sociais, assim como em salvaguardas e garantias financeiras de natureza operacional, ambiental e cultural. Em termos financeiros, os recursos podem ser oriundos de renda na exploração e royalties e/ou dividendos na participação nos resultados dos projetos. PARÁ NEGÓCIOS – A mineração é hoje a principal atividade econômica no Pará. Mas vários setores locais reclamam de um maior benefício econômico para o Estado, prejudicado pela Lei Kandir principalmente. O que pode ser feito para aumentar a internalização dos recursos obtidos com a atividade mineral no Estado? EDUARDO VALE – Primeiramente, um processo de internalização dos recursos gerados pela atividade mineral que conduza, em última instância, à agregação de valor no Pará, para ser consistente e sustentável não poderá estar apoiado em artificialismos. Ou seja, deverá aproveitar o momento. Respeitar a lógica do mercado sem perder a consistência econômica e financeira. São inúmeros os exemplos que podem ser mencionados. No indústria do aço, o processo de integração para trás por parte das siderúrgicas para garantir o fornecimento de minério de ferro acabou por alavancar a expansão da produção brasileira de aço voltada para a exportação. Nesse particular, o desempenho da Vale tem sido fantástico na atração de sócios produtores e consumidores de aço e minério de ferro. As críticas dirigidas à empresa parecem falta de assunto e jogo de cena. O Projeto do Complexo do Açu, no norte do Rio de Janeiro, da MMX é outro exemplo magnífico que começa a se materializar; No Brasil, são notórios os constrangimentos atuais e potenciais no que concerne aos componentes do custo-Brasil: energia, logística, tributação, burocracia, custos transacionais e disponibilidade adequada de informações geológicas, entre outras questões. Muito embora o setor público seja deficiente em prover a infra-estrutura adequada, como ocorre há décadas, a mineração empresarial muitas vezes consegue preencher as lacunas. Não é por acaso que a mineração brasileira ocupa papel de destaque no setor ferroviário, na geração de energia e no setor portuário. Agora, quanto aos demais componentes do custo-Brasil a palavra está com o setor público….. Veja, por exemplo, a questão do custo da energia e da migração potencial de novas plantas de alumínio para outros países. A despeito da matriz energética diversificada e das imensas reservas de bauxita de alta qualidade. Com o planejamento de médio e longo prazos e o trabalho articulado e de parceria entre as diferentes esferas do setor público e o setor privado é possível fazer com que as políticas públicas induzam maior agregação de valor e adensamento da cadeia produtiva em sintonia com o desenvolvimento sustentável. O enfoque da política mineral deve ser sistêmico, segundo o conceito do mineral-negócio que vai além da mera produção extrativa para abranger os segmentos da transformação mineral. Trata-se de uma analogia com o agronegócio. PARÁ NEGÓCIOS – Na sua avaliação, qual é o futuro da atividade mineral no Pará? EDUARDO VALE – Desde meados de 2003, a economia mineral global vivencia um período de forte expansão. A intensidade e amplitude desse processo configura um clima de negócios que foi denominado superciclo. Adere-se à visão de que o atual ciclo irá perdurar por muitos anos. Acredita-se que as esperadas correções nas expectativas econômicas globais, inclusive por conta do ajuste em curso, não comprometerão essa visão. Assim sendo, o Pará deverá assumir até 2018 o primeiro lugar no ranking nacional dos produtores de minérios. Essa ascensão consolidará definitivamente sua posição de relevo enquanto jurisdição mineral. No âmbito das jurisdições mais importantes da mineração global, a trajetória do Estado do Pará vem recebendo impulso decisivo e inexorável. Sua grande extensão territorial, sua extraordinária vocação mineral, que mal começa a ser descortinada, e a robusta carteira de projetos minero-industriais já definidos permitem antever futuro auspicioso. O Estado poderá ocupar, até 2018, a liderança nacional em valor da produção mineral do segmento extrativo. Em se tratando da exploração mineral, merece destaque sua liderança na concentração de empresas estrangeiras juniores e seniores, respondendo por aproximadamente 20% do total dessas empresas instaladas no País. Em uma visão de futuro, serão esses prospectos que oferecerão lastro à contínua renovação da carteira de projetos minero-industriais do Pará, consolidando-o entre as jurisdições mineiras de classe mundial. Ressalte-se que, no plano global, a despeito do otimismo, o ciclo atual tem se caracterizado por grandes desafios e pressões de custo tais como: gargalos na logística; carência de pessoal qualificado; riscos no suprimento e pressões de custo e nos prazos de entrega: energia, peças, equipamentos, pneus etc; aumento da carga tributária; insegurança jurídica, quebras de contrato e arcabouços legal e regulatório incompletos ou com modificações em curso; gestão ambiental, ordenamento territorial, relações com as comunidades e licença social etc. A influência desses fatores se faz presente também no Brasil. É inegável que o equacionamento dos desafios e ameaças impostos ao setor mineral brasileiro são, em grande parte, de responsabilidade do governo federal. Todavia, as ações dos governos estaduais e municipais podem ser decisivas. O setor mineral tem algumas características marcantes, com destaque para o risco elevado, longo prazo de maturação e alta intensidade de capital. Esses fatores demandam a implementação de uma política mineral pragmática, que encerre as melhores práticas da política e da programação setorial e seja eficaz. Para tanto, deverá estar lastreada em sistema de informações especializado e no assessoramento técnico de alto nível, entre outros atributos. Ou seja, o Pará precisará investir na formação e na capacitação de recursos humanos direcionados para o mineral-negócio; A falta de uma secretaria, ainda que, do tipo ?mineração, indústria e comércio? aponta insensibilidade com relação à importância do setor mineral e seu potencial de contribuição para o desenvolvimento do Pará. A manifestação do Vice-Governador em favor da criação de uma secretaria especializada sugere que correções básicas e fundamentais estariam a caminho. Assim sendo, acompanho com grande expectativa o relatório do grupo de trabalho constituído pelas Secretarias de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia e da Fazenda com o objetivo de subsidiar uma nova política mineral para o Estado.
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