Necessidades e interesses convergentes: a sustentabilidade na indústria mineral
30/04/09
Por Orlando Lima*
Por mais paradoxal que pareça, poucas indústrias estão mais próximas de promoverem um novo paradigma de desenvolvimento sustentável que a mineração e o petróleo. ;Movidas pela experiência passada e pela demanda durante o recente boom das commodities, as grandes empresas de mineração e petróleo, historicamente combatidas como geradoras de degradação ambiental, vêm se engajando em processos que podem ser o prenúncio de novos tempos de sustentabilidade territorial. A crise internacional, que levou a uma profunda revisão nas carteiras de investimentos desses setores, provocou a redução no ímpeto desse processo, sujeito às mesmas limitações orçamentárias do negócio, mas o novo paradigma já está em construção.;Alguns fatores explicam essa nova perspectiva. As indústrias extrativas minerais não escolhem onde vão encontrar reservas comerciais e produzir, elas operam nos locais onde os minerais são encontrados. Por outro lado, na grande maioria das vezes, as reservas minerais se situam em regiões carentes levando as empresas a realizarem investimentos em infra-estrutura e desenvolverem estratégias para se adaptarem às condições locais. Além disso essas empresas chegam a esses territórios para ficarem ao longo de décadas e buscam um convívio local nas melhores condições possíveis para que possam operar nos níveis desejados de produtividade.;No encontro de uma grande indústria com um território ambiental, social e institucionalmente vulnerável há sempre um risco significativo. Mas é nesse encontro que se apresenta uma das maiores oportunidades de desenvolvimento sustentável para esses territórios. E por que?;Além da responsabilidade social corporativa, para que as empresas implantem seus projetos nos custos e prazos previstos, elas enfrentam o enorme desafio de se relacionarem com comunidades e poderes públicos locais. Dado os impactos causados pelo empreendimento, se esse relacionamento não for positivo, pode colocar em risco a chamada ?Licença Social para Operar?, que não é um documento formal, mas que se traduz a qualidade do relacionamento da empresa com seus stakeholders. Se esse relacionamento for ruim, gera conflitos que podem comprometer projetos, operações e a própria geração de valor ao acionista que investe na empresa. Num ambiente de alta vulnerabilidade socioambiental esse é um risco permanente para projetos minerais, que tem gerado um penoso e significativo aprendizado às empresas. A saída para esse desafio passa pela promoção do desenvolvimento sustentável da região durante o ciclo mineral, indo ao encontro de demandas sociais, econômicas e ambientais do território.;De outro lado, temos acompanhado a problemática de municípios brasileiros diante da crise, especialmente dos municípios mineradores e produtores de petróleo, em função da redução de royalties fruto da redução da produção e dos preços das commodities. Agravada pelas recentes notícias sobre a alocação desses recursos em atividades de custeio da administração municipal, essa tendência traz à tona uma realidade que merece reflexão. É fato que os municípios mineradores e produtores de petróleo, precisarão se desenvolver para, a médio prazo, tornarem-se independentes da receita dos royalties e participações, que é finita e acompanha a evolução e declínio do ciclo mineral. Se não o fizerem, enfrentarão o grave problema de custear sua estrutura municipal, ampliada durante os tempos de bonança econômica, sem as receitas abundantes do período de boom. A crise atual é um importante sinal de alerta para a urgência de mecanismos que promovam o desenvolvimento sustentável e de uma economia pós-mineral que gerem perspectiva de um futuro sustentável para essas comunidades.;Da convergência de interesses do empreendedor mineral e dos municípios, cria-se espaço para um novo pacto transformador da realidade desses territórios em prol do desenvolvimento sustentável com benefícios para ambos e para a comunidade.;Esse pacto é perfeitamente factível, através de abordagem que chamo ?Empreendimento de Duplo Valor?, cujos contornos começam a se delinear em diferentes regiões do planeta onde são intensificadas as ações socioambientais integradas aos empreendimentos minerais. ?Empreendimentos de Duplo Valor? têm por objetivo gerar valor ao acionista da empresa ao mesmo tempo em que visam gerar valor à sociedade onde estão inseridos, com a mesma intensidade e determinação. Esses empreendimentos somente se viabilizam através de um novo padrão de parceria entre o empreendedor, o poder público e a sociedade civil, mantidos seus respectivos papéis.;Um exemplo dessa nova concepção é o conceito de ?Capacitação Social?. Tem grande valor para o empreendedor a existência mão de obra local capacitada viabilizando sua contratação para as atividades da empresa. Da mesma forma é do interesse da sociedade local absorver o máximo possível dos empregos gerados pelo projeto mineral, promovendo a inclusão social e absorção de renda na região. Uma estratégia de investimento social privado em educação fundamental, em parceria com o município, integrada à capacitação profissional na região promove resultados sociais de ?duplo valor?. A ?Expansão Sustentável de Cidades? é outra oportunidade. Através do desenvolvimento urbano de qualidade com infraestrutura e habitação digna para diferentes níveis de renda gera-se valor para a sociedade e para o empreendedor pois permite acomodar pessoas que chegam para trabalhar no empreendimento e a população local. Uma estratégia de investimentos em infraestrutura e habitação aliada à um fundo garantidor de sustentabilidade com recursos de royalties podem viabilizar um novo padrão urbano nessas comunidades, gerando ?duplo valor? além de ampliar fontes de recursos desses municípios. Estratégias desse tipo, no entanto, não ocorrem espontaneamente, elas precisam ser planejadas e gerenciadas com esse foco.;Em territórios mais vulneráveis, a responsabilidade do empreendedor é maior. Caberá a ele a iniciativa da promoção do pacto para realização de ?Empreendimentos de Duplo Valor? através de parcerias com o poder público e demais stakeholders. Acostumado ao ?mantra? da geração de valor ao acionista, o empreendedor precisará atuar progressivamente fora de sua ?zona de conforto? no papel de articulação local com diferentes atores orientado ao longo prazo para alcançar esses resultados. Mas os benefícios valem o esforço, pois o que hoje é apenas estratégia promissora, no futuro pode se tornar condição para o desenvolvimento de grandes empreendimentos minerais.* Orlando Lima (orlando@janusconsult.com.br) é colunista fixo de Plurale, escrevendo um artigo por mês. É diretor da Janus Consultoria em Sustentabilidade.
;
(Envolverde/Revista Plurale)
Zoonews