ONU autoriza Brasil a ampliar limites de sua fronteira marítima
07/05/07
Além das 200 milhas náuticas, País tem 712 mil quilômetros quadrados da plataforma continental e briga por mais
Tânia Monteiro
Desde o mês passado, os livros didáticos estão autorizados a ensinar que o Brasil tem exatos 12,712 milhões de quilômetros quadrados, e não apenas os 8,5 milhões de quilômetros quadrados informados a todas as gerações de estudantes. A Organização das Nações Unidas (ONU) deu sinal verde para o País incorporar, para além das 200 milhas náuticas, mais 712 mil quilômetros quadrados de extensão da chamada plataforma continental. Nessa área, correspondente ao tamanho dos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná, o País também já tem assegurada a soberania de exploração e aproveitamento de todos os recursos naturais do solo e do subsolo marinhos.Os 12,7 milhões de quilômetros quadrados são a soma dos 3,5 milhões da chamada Zona Econômica Exclusiva (ZEE) com os 712 mil quilômetros reconhecidos em abril pela ONU. Mas o Brasil quer mais e pode, ao fim do processo de legalização da plataforma continental, que vai até maio de 2009, transformar-se em uma nação com 12,95 milhões de quilômetros quadrados, o equivalente a quatro Índias.Além dos 712 mil quilômetros quadrados já concedidos, a Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (Cirm) requereu à mesma Comissão de Limites da Plataforma Continental das Nações Unidas (CLPC) outros 238 mil quilômetros quadrados – uma área do tamanho do Ceará, à qual entende ter direito.LEVANTAMENTOPara fazer jus a esse espaço de `terra molhada`, o Brasil foi obrigado a desenvolver um minucioso trabalho de mapeamento científico da plataforma continental. Esse detalhamento foi feito pela Marinha durante 17 anos – de 1987 a 2004. Nesse período, foram investidos US$ 40 milhões – metade desse custo bancado pela Petrobrás – no chamado Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (Leplac), com os navios da Marinha percorrendo 230 mil quilômetros na região, o que corresponde a cinco voltas e meia na Terra. Em síntese, a Marinha e a Petrobrás fizeram uma coleta de dados que mostram à ONU todo o conhecimento brasileiro da plataforma continental.`Do total do nosso comércio exterior, 95% é feito pelo mar. Além do petróleo, temos o gás. Temos ainda os recursos vivos, o turismo e estamos abrindo campo para mapear as riquezas minerais do fundo do mar`, disse ao Estado o comandante da Marinha, Julio Soares de Moura Neto. `Isso mostra a importância da nossa Amazônia Azul`, acrescentou, referindo-se ao território no mar e em comemoração ao fato de a plataforma continental ter crescido mais um pouco.`Mais de 700 mil quilômetros quadrados já foram aprovados e vamos continuar discutindo se temos ou não direito aos outros quase 250 mil que tínhamos pleiteado de início. Esses 950 mil quilômetros quadrados correspondem aos Estados de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e um pouco mais do que Santa Catarina. O Brasil tem de entender que o mar é fundamental para sua economia`, observou Moura Neto.QUESTÃO DE ESTADOEle explicou que o governo não está preocupado `só com cifras`, ao se referir à importância econômica dessa região marítima. `Estamos discutindo limites de fronteiras porque essa é uma questão de Estado`, argumentou. `Não podemos garantir se nessa área há ou não petróleo, se há ou não outra riqueza. Só que, tão importantes quanto os aspectos econômicos, são os limites do Brasil , dos quais não podemos abrir mão.`Depois de insistir em que todas as riquezas que existem na Zona Econômica Exclusiva e na área nova da plataforma `pertencem juridicamente ao Brasil`, o comandante alertou para o fato de que `o Estado tem direito de soberania sobre ela, mas não soberania plena`. O Brasil pleiteou à ONU a inclusão em sua plataforma de cinco áreas: cone do Amazonas, cadeia Norte brasileiro, cadeia Vitória e Trindade, platô de São Paulo e margem continental Sul. `Destas, apenas o platô de São Paulo foi aceito integralmente pela ONU. Nas demais, concordaram com 75% do que pedimos`, informou o comandante, ao anunciar que o governo pedirá revisão da decisão e já está estudando a questão.HISTÓRICOA Convenção da Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) dizia que cada país deveria apresentar pedido de ampliação de sua plataforma no prazo de dez anos, depois que tivesse ratificado a convenção. O Brasil ratificou a convenção em novembro de 1994 e, em 2004, entregou pedido de extensão da plataforma continental. `De 2004 a 2006, uma comissão de limites da plataforma continental da ONU, com sete peritos, avaliou nossa proposta em várias reuniões`, disse Moura Neto. Segundo o comandante, no fim de março o Brasil fez sua defesa final na ONU e, no mês passado, a comissão de limites da plataforma continental formulou suas recomendações, informando que aceitava 75% do que o País pleiteara.Com esse estudo, o Brasil provou que a plataforma continental brasileira, que é o prolongamento natural da massa terrestre de um Estado costeiro, é de 350 milhas em áreas da Guiana até Natal e do Espírito Santo até o Rio Grande do Sul, e não só as 200 milhas a que todos os países podem ter direito. Essa é a chamada Amazônia Azul, área maior que a Amazônia Verde. A Rússia foi o primeiro país a apresentar à ONU pedido de extensão de sua plataforma continental, mas teve a proposta rejeitada pela instituição. A Austrália também já apresentou proposta.DadosA extensão que o Brasil terá se conseguir os 238 mil quilômetros a mais que ainda reivindica da ONU3.500.000 Km2Área marítima hoje sob jurisdição do Brasil950.000 Km2é de quanto será a ampliação total4.450.000 Km2Será a área total da Amazônia Azul
Minérios atraem empresas, que temem risco ambiental
`País ainda não tem noção exata de riqueza submersa`, adverte diretor do Instituto Brasileiro de Mineração
Tânia Monteiro
Os empresários de mineração estão `muito interessados` na exploração do solo e do subsolo marinho – atividade amplamente desenvolvida em países como Canadá, Reino Unido, França, Japão e Holanda. Mas eles têm uma preocupação especial: enfrentar problemas na área ambiental, a exemplo das dificuldades criadas para a construção de hidrelétricas no Rio Madeira, em Rondônia.O diretor de Assuntos Minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Marcelo Ribeiro Tunes, que participou de um seminário promovido pela Marinha para discutir o assunto, em Brasília, contou que estudos realizados pelo governo chegaram a um ponto de amadurecimento que já permite que a iniciativa privada entre ativamente na discussão.`Os interesses das empresas são distintos. A indústria da construção, por exemplo, está interessada em areia e cascalho, matéria-prima do concreto`, disse Tunes ao Estado. Leia abaixo os principais trechos da entrevista concedida pelo empresário.RIQUEZAS A EXPLORAR`Além de em areia e cascalho, há empresas interessadas no fosfato usado para fertilizante agrícola, no carvão mineral para a indústria siderúrgica ou no enxofre, produto de que importamos 80% do que consumimos. Também existem estudos que mostram possíveis concentrações de ouro e diamante.`PAPEL DA MARINHA`Temos um problema que é de marco regulatório. Do ponto de vista da Marinha e do Ministério das Minas e Energia, é muito simples, porque o próprio Código de Mineração, de 1967, prevê claramente como se faz essa exploração. Pela lei, o processo para requerer e conceder a autorização para exploração mineral no continente e no mar é o mesmo. A única diferença é que, em se tratando de uma área da Marinha, ela tem de opinar previamente, como prevê o código.`QUESTÃO AMBIENTAL`O problema que tem aparecido é o problema ambiental. Este marco é que não está muito claro. Houve o caso em que se obteve autorização de pesquisas pelo DNPM (Departamento Nacional da Produção Mineral), foram feitos investimentos e, de repente, entrou uma questão ambiental que não está bem resolvida. O investimento foi todo perdido.`MARCO REGULATÓRIO`A atividade marinha, por ser nova para o Brasil, já tem um componente de risco mais elevado. Agora, com o risco ambiental, há necessidade de mais clareza nos marcos regulatórios. Mas o setor está interessado nas explorações. As operações de mineração são feitas no mundo todo e precisávamos fazer aqui também. O País ainda não tem noção exata de suas riqueza submersa. Na Grã-Bretanha, toda areia e cascalho vêm do mar. No Canadá, 80% da produção sai da costa leste.`INTERESSE ESTRANGEIRO`Certamente há interesse de empresas estrangeiras virem para cá auxiliar a fazer esse trabalho, já que elas têm uma grande experiência nisso. Pode ser uma joint venture, por exemplo, muito comum na área. Mas precisa de marco regulatório claro.`MINÉRIOS`Tem aí 10 a 12 substâncias minerais ou até mais, de interesse, que poderiam ser exploradas e aproveitadas. No litoral do Rio Grande do Sul, há formações de carvão mineral. Temos ainda rochas fosfáticas, cuja grande aplicação é na agricultura, como fertilizantes. Há o enxofre, de que somos muito carentes. Os estudos mostraram ainda que existem algumas concentrações de minerais que resistem ao processo de erosão. O ouro é um deles, os diamantes também. Agora a Marinha começa a disponibilizar para as empresas as informações que tem.`
Após 10 anos, País vai mapear riquezas
Governo já falou com empresários, mas não tem prazo para exploração
Tânia Monteiro
Criado em dezembro de 1997 para descobrir e mapear as riquezas existentes na costa brasileira, o programa de levantamento da potencialidade mineral da plataforma continental jurídica brasileira finalmente começa a sair do papel.Há dois meses, o governo chegou a promover um encontro com empresários interessados na exploração das riquezas do mar, para informar que deu início aos trabalhos de levantamento de geologia e dos recursos minerais para saber exatamente o que há nas profundezas do mar, além de petróleo e gás, que não estão incluídos nessa pesquisa.`Estamos dando os primeiros passos e não há a menor previsão de quando poderiam ter início a exploração das riquezas`, disse ao Estado o comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura Neto. `O Brasil tem de entender que o mar é fundamental para a sua economia e não é só o petróleo, o gás e a pesca que são importantes riquezas.`De acordo com o comandante, `o País vai começar a fazer exploração geológica para dizer que minérios temos, onde eles estão e se vale a pena explorá-los agora ou só no futuro, quando se esgotarem as nossas reservas em terra`.Moura Neto lembrou que outros ministérios colaboram com o levantamento e frisou que a autorização para explorar essas riquezas será decisão que cabe só ao governo.`O encontro com os empresários foi exatamente para dar notícia de que o governo iniciou o levantamento da plataforma continental, ou seja, estamos montando um programa nacional de trabalho, que já foi aprovado e, agora, estamos começando a receber os recursos do Ministério da Ciência e Tecnologia para equipar os navios. Mas será um trabalho longo, muito longo`, avisou o comandante da Marinha.
O Estado de São Paulo